Domingo, 03 de Agosto de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 3 de agosto de 2025
Durante um parto de emergência na região metropolitana de Belo Horizonte (MG), uma menina de 12 anos, grávida de oito meses, morreu. O caso, ocorrido em 13 de julho, é mais um a expor o ciclo de violência a que meninas grávidas são submetidas no Brasil. De acordo com dados do Sinasc/Datasus, a cada hora, 44 adolescentes dão à luz no País, 5 delas têm menos de 15 anos.
A maioria das gestações é fruto de estupro —segundo a lei vigente, toda relação sexual com menores de 14 anos é considerada estupro de vulnerável. Apesar disso, somente 4% delas conseguem acessar o aborto legal.
“A adolescência acaba quando você se torna mãe”, diz Raquel (nome fictício). “Você já não pode fazer as coisas de um adolescente normal”, acrescenta ela, que engravidou aos 13.
Athenê Mauro, responsável pela área técnica de saúde da criança e do adolescente da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, lembra que a gravidez antes dos 14 anos eleva os riscos de eclâmpsia, parto prematuro, má formação do bebê e depressão pós-parto.
“Além de ser um problema individual ou regional, a gravidez precoce é uma questão social e global, com impactos coletivos”, diz Lia Navegantes, que integrou programa um programa do Governo do Estado do Pará de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual.
A gravidez é a principal causa de evasão escolar feminina na América Latina. No Brasil, 60% das mães adolescentes não estudam nem trabalham, segundo dados de 2015 do IBGE.
Meninas negras e de baixa renda são as mais afetadas, dizem especialistas, referendando dados da Secretaria da Saúde da cidade de São Paulo. Nesta faixa etária, é mais difícil reconhecer a gravidez, além do receio de contar à família –principalmente nos casos de violência intrafamiliar. Com isso, o acesso ao aborto nos casos previstos por lei, dentro do prazo de 22 semanas, é dificultado.
Sem um responsável, muitas adolescentes não conseguem atendimento ginecológico ou acesso a um pré-natal.
“Elas só são atendidas acompanhadas”, afirma Renata Santos, gerente de um serviço de acolhimento institucional (Saica), vinculado à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo.
O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) exige que menores de 12 anos sejam atendidos com um responsável, salvo em situações de emergência. Por lei, menores de 18 anos tampouco podem sair do hospital sem um adulto. Quando a família as abandona, são encaminhadas aos Saicas.
A maternidade na adolescência é desafiadora —tanto na construção de vínculos quanto para conciliar o cuidado com a garantia dos direitos da jovem.
“Faltam recursos psíquicos e materiais, apoio e reconhecimento institucional para isso, de maneira que muitas vezes as avós, senão toda comunidade, assumem a criação”, afirma Navegantes.
Em várias ocasiões, a gravidez na adolescência resulta em casamento. O Brasil registra, em média, 43 uniões de menores de 18 anos por dia, sendo 40 de meninas, aponta o IBGE. Desde 2019, o casamento de pessoas com menos de 16 anos é proibido, porém, em 2022, foram registrados 282 casos —260 envolvendo meninas.
Além disso, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia aponta que 32% das adolescentes voltam a engravidar no primeiro ano após o parto. Em casos de extrema vulnerabilidade, há a possibilidade do acolhimento institucional. “Muitas vezes essas meninas não querem denunciar, não querem sair da família delas”, explica Navegantes.
Em outras, elas próprias buscam o acolhimento institucional, como Raquel, que viveu dos 13 aos 18 anos em um Saica com seu bebê.
O acesso ao sistema legal também depende de um responsável. De acordo com o juiz Alberto Munhoz, da Vara da Infância e da Família, “o afastamento produz mais uma violência. É necessário que o trabalho seja feito no sentido de reinseri-las em suas famílias, o que é mais difícil no caso de meninas com bebês.”
A maioria dos Saicas é mista, em idade e em gênero. Raquel, porém, ficou em um dos poucos voltados a meninas mães e seus filhos. Ao atingir os 18 anos, se não há possibilidade de reinserção familiar, as mães precisam se retirar da instituição, às vezes, sem a criança.
Dulce Coppedê, psicóloga do Tribunal de Justiça de São Paulo, explica que a capacidade da mãe adolescente de cuidar do próprio filho acaba colocada em julgamento. Isso pode levar ao afastamento da jovem do bebê ou da própria família, o que representa mais uma forma de revitimização —enquanto o homem permanece distante de qualquer obrigação legal. (Com informações do jornal Folha de S.Paulo)
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