Segunda-feira, 30 de Junho de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 29 de junho de 2025
Quando a empresa chinesa DeepSeek lançou seu modelo de inteligência artificial, o mercado global ficou surpreso. A ferramenta rivalizava com gigantes como o ChatGPT, mas foi desenvolvida com uma fração do investimento e poder computacional usados por concorrentes ocidentais. Em poucos dias, gigantes da tecnologia dos EUA perderam quase US$ 1 trilhão em valor de mercado.
Apesar da impressão de novidade, o lançamento do DeepSeek é resultado de uma estratégia planejada há mais de uma década pela China, com o objetivo claro: tornar-se líder global em IA até 2030. Para o Brasil, o exemplo serve de inspiração — embora especialistas estimem que o país esteja pelo menos dez anos atrás nessa corrida.
Embora os Estados Unidos ainda sejam líderes na aplicação da tecnologia, a China domina em pesquisa. Em 2023, 70% das patentes e 86% das publicações científicas sobre IA vieram do país asiático — fruto de um avanço contínuo ao longo da década de 2010.
Investimento estratégico
Para alcançar esses números, a China apostou em políticas industriais focadas na criação de infraestrutura tecnológica, formação de especialistas e incentivo à inovação. Tudo isso mesmo sem acesso aos equipamentos mais avançados, como chips e semicondutores — uma limitação semelhante à enfrentada pelo Brasil.
A diferença, segundo especialistas, está no foco de longo prazo. “O sucesso da China é fruto de mais de dez anos de política industrial bem planejada”, afirma Luca Belli, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Rio. “Eles estudam experiências estrangeiras, copiam o que funciona e adaptam ao seu contexto.”
O marco dessa estratégia foi o Plano de Desenvolvimento de Inteligência Artificial de Nova Geração, lançado em 2017. Mas a base já havia sido lançada com iniciativas como Internet Plus e Made in China 2025, ambas de 2015, que priorizavam a digitalização da economia e a modernização industrial.
“São planos complementares que direcionam investimentos para setores estratégicos como conectividade móvel, redes de fibra óptica, data centers, robótica e software”, explica Alcides Peron, professor da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.
Os números
Embora não haja dados oficiais consolidados, uma análise da Universidade de Stanford mostra que, entre 2000 e 2023, fundos estatais chineses destinaram cerca de US$ 912 bilhões a setores estratégicos, incluindo IA. No setor privado, foram investidos mais US$ 119 bilhões entre 2013 e 2023, segundo o AI Index Report 2025, também da Stanford.
Para comparação, o Brasil atraiu US$ 2 bilhões em investimentos privados no mesmo período — valor semelhante ao de países como Áustria, Argentina e Irlanda.
Nos EUA, o investimento é majoritariamente privado, mas o papel do Estado é fundamental. “Não se desenvolve IA sem o Estado. Essa fantasia não existe”, diz Peron. Belli concorda: o apoio público é essencial para pesquisa básica e criação de capacidade nacional.
Brasil: primeiros passos
No Brasil, a primeira medida estruturada para o desenvolvimento da IA começou a ser executada somente em 2024. O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), lançado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, prevê investimentos de R$ 23 bilhões até 2028. O plano se organiza em cinco eixos: infraestrutura, educação, inovação empresarial, serviços públicos e governança.
Além disso, há outras iniciativas voltadas à transformação digital, coordenadas pelo Comitê Interministerial para a Transformação Digital (CITDigital), reativado em abril. O comitê reúne ministérios e estatais para alinhar políticas de digitalização e tecnologia.
Apesar de ter acesso ainda mais limitado que a China a supercomputadores e chips de ponta, o Brasil tem potencial para avançar se apostar em formação de pessoal qualificado e criatividade. “O DeepSeek provou que a IA não tem dono. Você pode fazer muito com menos infraestrutura, mas não sem capital humano”, afirma Teresa Ludermir, professora de IA da UFPE.
Caminho possível
O avanço chinês em IA não é apenas técnico — é também geopolítico e estratégico. Para o Brasil, entender esse modelo pode ser o primeiro passo para acelerar sua própria trajetória. A combinação de investimento público, planejamento de longo prazo e valorização da ciência mostra que há caminhos possíveis mesmo para países fora do eixo EUA-China. Com informações de O Estado de S. Paulo
No Ar: Pampa Na Madrugada