Quinta-feira, 09 de Outubro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 9 de outubro de 2025
O Brasil vive, mais uma vez, um momento de aumento da tensão fiscal. O crescimento da dívida pública, a manutenção de déficits primários sucessivos e a incapacidade de conter o avanço das despesas obrigatórias acendem um alerta que vai muito além dos círculos técnicos. Os reflexos já são perceptíveis: para controlar a inflação e manter a credibilidade da política monetária, o Banco Central mantém a segunda maior taxa de juros real do mundo, o que encarece o crédito, inibe o investimento produtivo e aumenta o risco de uma onda de inadimplência.
O problema é conhecido, mas a resposta política ainda parece insuficiente. O debate atual muitas vezes tenta transformar a solução em uma escolha de caminho único: cortar despesas ou revisar isenções fiscais. Esse é um falso dilema. A magnitude do desafio brasileiro exige a combinação das duas coisas, com igual determinação. Há espaço para a diminuição de despesas e também existem condições para maior justiça tributária.
De um lado, é imprescindível um compromisso firme com a redução das despesas públicas. Isso significa ir além de cortes pontuais e atacar os verdadeiros focos de ineficiência. A tão adiada reforma administrativa precisa sair do papel, enfrentando privilégios, distorções salariais e uma estrutura de cargos muitas vezes descolada das necessidades reais da sociedade. O Estado brasileiro precisa ser mais leve, mais eficiente e mais focado em entregar serviços públicos de qualidade.
De outro lado, é impossível ignorar o tamanho da conta das renúncias fiscais. Segundo dados da Receita Federal, o Brasil abriu mão de R$ 700 bilhões em receitas em 2024 por meio de isenções, benefícios e regimes especiais. Isso representa cerca de 7,5% do PIB, um dos maiores percentuais entre as grandes economias do mundo. O mais preocupante é que mais da metade desse valor não apresenta contrapartidas claras em termos de geração de emprego, investimento ou benefícios sociais. Em outras palavras, são privilégios tributários que beneficiam poucos e custam caro para o conjunto da sociedade.
Além disso, existe uma espécie de “caixa-preta” tributária: mais de R$ 190 bilhões em isenções sem controle efetivo, boa parte concentrada em regimes especiais de importação. Os estados também sofrem com o fenômeno: em 2023, cerca de R$ 230 bilhões deixaram de ser arrecadados em ICMS devido a benefícios fiscais, com casos extremos como o Amazonas, onde as renúncias alcançaram 52,5% da receita potencial.
Por mais que seja politicamente delicado mexer nesses privilégios, a atual situação fiscal não comporta mais postergações. A revisão das isenções, somada à redução de gastos, precisa ser acompanhada de reformas estruturantes. A reforma tributária, já aprovada em parte e agora em fase de reforma regulamentação, deve buscar simplificação, neutralidade e justiça fiscal. Uma revisão cuidadosa da reforma previdenciária, para corrigir eventuais distorções ainda existentes, também deve entrar na pauta. Todas essas frentes precisam avançar de forma coordenada e com senso de urgência.
O mercado, os investidores e a sociedade como um todo esperam sinais claros de responsabilidade fiscal. Sem isso, o país permanecerá preso a um ciclo vicioso de juros altos, baixo crescimento e risco fiscal crescente. Não há mais espaço para meias soluções. A superação do desequilíbrio fiscal brasileiro exige ação simultânea: cortar despesas de forma estrutural e enfrentar de maneira firme a indústria dos privilégios tributários.
O equilíbrio das contas públicas não é uma questão de escolher entre uma coisa ou outra. É, inequivocamente, a soma do ataque imediato ao excesso de gastos e concomitante diminuição das renúncias fiscais. A mentalidade perdulária, tão característica de um Brasil que ainda não aprendeu a ser austero, deve ser substituída por um novo modelo mental, no qual o zelo pelo dinheiro público seja a condição primeira para uma mudança efetiva.
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