Quarta-feira, 15 de Outubro de 2025

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O recente cessar-fogo em Gaza, acompanhado pela libertação dos reféns israelenses, representa um ponto de inflexão na dinâmica do Oriente Médio. Depois de anos de instabilidade, abre-se uma rara oportunidade para a reconstrução política e humanitária da região. Nesse processo, o retorno de Donald Trump ao centro das negociações internacionais recoloca os Estados Unidos como principal mediador e garante uma possível paz duradoura — agora ancorada no pragmatismo dos Acordos de Abraão.

Durante seu primeiro mandato, Trump foi o catalisador de uma guinada diplomática que alterou profundamente o mapa das alianças regionais. Ao viabilizar a normalização das relações entre Israel e vários países árabes, como Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão, inaugurou uma lógica baseada em benefícios concretos: comércio, tecnologia e segurança. Esse modelo, que substitui a retórica ideológica pela cooperação estratégica, mostrou-se resiliente e serve hoje de base para uma nova rodada de aproximações — possivelmente incluindo a Arábia Saudita.

O fim do conflito em Gaza não se explica apenas pela fadiga das partes, mas pela combinação de pressão diplomática e realismo político. Washington, sob liderança republicana, vem articulando uma frente de países árabes moderados que compartilham o interesse em conter o avanço de grupos extremistas e isolar o Hamas. A devolução dos reféns israelenses, eixo moral das conversas, consolidou o entendimento de que não há estabilidade possível sem responsabilização pelos atos terroristas que desencadearam o conflito.

O contexto regional também favorece essa inflexão. O Irã, peça central no tabuleiro de instabilidade regional, atravessa um momento de enfraquecimento interno e perda de tração internacional. As sanções econômicas, o conflito com Israel, a contestação popular e as divisões dentro do regime dos aiatolás corroem sua capacidade de sustentar uma rede de milícias e grupos por procuração. O impacto combinado da pressão econômica e crescente cooperação árabe-israelense tem reduzido o espaço de manobra dessas organizações, que há décadas atuam como braços desestabilizadores de Teerã. A retomada do protagonismo americano, portanto, não é apenas diplomática: ela redefine o equilíbrio estratégico, limitando a influência iraniana e reforçando a posição de Israel como âncora de segurança regional.

Os desafios, contudo, permanecem significativos. A reconstrução de Gaza exigirá coordenação internacional e a ampliação dos Acordos de Abraão depende da capacidade de conciliar interesses divergentes. A chave está em combinar garantias de segurança para Israel com incentivos econômicos para os vizinhos árabes — uma “paz pragmática”, sustentada por investimentos e integração tecnológica.

Mais do que exaltar lideranças individuais, o momento exige visão de longo prazo. Se a reaproximação entre Israel e o mundo árabe for consolidada, e se o Irã continuar a perder sua capacidade de projetar poder pela via da violência, o Oriente Médio poderá enfim ingressar em uma fase de estabilidade relativa — rara, mas possível.

Estamos diante de um possível equilíbrio regional baseado não em ilusões ideológicas, mas em interesses comuns, segurança compartilhada e cooperação concreta.

Márcio Coimbra é CEO da Casa Política e Presidente-Executivo do Instituto Monitor da Democracia. Conselheiro e Diretor de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal.

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