Quinta-feira, 23 de Outubro de 2025

Home Variedades Atriz brasileira é premiada em Veneza por obra ousada sobre violência sexual

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Dois anos após provocar comoção no Festival de Avignon, no sul da França, a atriz, dramaturga e diretora brasileira Carolina Bianchi foi premiada, no último sábado (19), com o Leão de Prata na Bienal de Dança de Veneza, na Itália, como um reconhecimento ao diálogo que promove entre dramaturgia, trauma, as origens da misoginia e uma sexualidade em crise.

Em 2023, no festival francês, ela apresentou “A Novia e o Boa Noite Cinderela”, primeiro espetáculo da trilogia “Cadela Força”, em que investiga a história da arte e a violência sexual contra as mulheres.

Na peça, com duas horas e meia de duração, ela usa o próprio corpo, inconsciente após o consumo de um coquetel de tranquilizantes, para encenar e denunciar o estupro. A obra começa com uma conferência em que Bianchi lê, em português, trechos de “Inferno”, da primeira parte de “A Divina Comédia”, de Dante.

O ousado desafio físico e psicológico levou Bianchi a tornar-se uma referência da cena experimental. A apresentação inseriu a brasileira na tradição das experiências mais extremas da performance artística feminina, em uma lista que inclui a francesa Gina Pane, a sérvia Marina Abramovic e a cubana Tania Bruguera.

“Investir em artistas para criar o trabalho que desejam é fundamental para a Bienal de Dança. Nossos Leões de Prata, artistas mais jovens que ainda têm muito a dizer sobre suas obras e tempo para isso, não são apenas celebrados em Veneza, mas também recebem apoio para seu próximo grande projeto”, disse Wayne McGregor, diretor da bienal.

Bianchi, nascida em Porto Alegre, estudou na Escola de Artes Dramáticas da Universidade de São Paulo e trabalhou na capital paulista durante dez anos com o coletivo teatral Cara de Cavalo, da cena independente.

Em 2020, decidida a voltar a estudar, mudou para Amsterdã, na Holanda, para cursar um mestrado e investigar mais profundamente as possibilidades de sua dramaturgia e presença de palco. Na Europa, colocou em prática a pesquisa sobre a trilogia, que há tempos rondava os seus pensamentos.

No espetáculo “Lobo”, de 2019, apresentado na Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, por exemplo, ela dividiu a cena com 16 homens, entre atores, bailarinos e músicos, em uma sequência performática em que corriam, despencavam no chão, transavam e declamavam poemas de Emily Dickinson.

Apesar de algum reconhecimento, o grupo enfrentou tempos difíceis na cidade, principalmente devido à falta de recursos financeiros.

Após o sucesso em Avignon, o respaldo europeu permitiu à artista a estreia, na Bélgica, da segunda parte da trilogia, “A Irmandade”, também apresentada em Veneza na semana de premiação.

“O prêmio é um reconhecimento que eu nunca imaginei que poderia acontecer, porque geralmente a gente pensa nessas coisas como algo distante”, disse logo após a cerimônia. “A premiação reconhece um trabalho de investigação e também o corpo que passa por essa jornada através de diferentes experimentações da linguagem.”

Nos agradecimentos, Bianchi falou sobre o risco de investigar algo a fundo. “Esse prêmio reconhece a recusa da arte como substância apaziguadora de sensações.”

Para a artista, a sexualidade é matéria complexa e desorganizada e o corpo é veículo de investigação sobre tempo e memória —ou a falta dela. “Adentrar na floresta escura da criação é um processo violento e extremamente transformador”.

Bianchi segue trabalhando com o coletivo Cara de Cavalo, agora com os artistas se dividindo entre o Brasil e a Europa. Não há previsão para que os espetáculos da trilogia sejam apresentados em palcos brasileiros, apesar de isso ser o desejo da artista.

“Eu adoraria, é o nosso lugar. Fazemos uma peça que é totalmente falada em português, são três horas e meia de português. Desejo compartilhar com o lugar de onde a gente veio”, diz sobre “A Irmandade”.

No espetáculo atual, Bianchi aborda um sistema de fraternidade masculina, que muitas vezes atua em detrimento às vidas das mulheres e é chamado de “Brotherhood” pela antropóloga argentina Rita Segato, uma pesquisadora da violência de gênero. A dramaturgia da brasileira faz uma ligação entre esse sistema e a história do teatro.

A obra é uma continuidade de “A Novia e o Boa Noite Cinderela” a partir da pergunta sobre o que acontece quando alguém se recupera de uma agressão —a artista sofreu uma violência sexual há 12 anos, o que deu origem às pesquisas que realiza. A terceira parte da trilogia deve estrear em 2026.

“Muita gente me pergunta por que é uma trilogia. Acho que tem uma questão nessa temporalidade, de deixar uma coisa reverberar na outra”, afirma. “Tem um processo de criar, mas também observar o que é aquilo e no que vai se transformando. As questões não são estanques, elas vão se movendo”. As informações são da Folha de S. Paulo.

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