Segunda-feira, 06 de Maio de 2024

Home Política Caso Bebel Gilberto: o que está por trás das bandeiras pisoteadas nos palcos

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Ao sambar sobre a bandeira do Brasil em show no final de semana, Bebel Gilberto sentiu logo que havia pisado na bandeira e na bola por ter presenteado, como disse ela mesma, uma “extrema direita louca para destilar seu falso patriotismo”. Se arrependeu, pediu sinceras desculpas e nem ensaiou uma discussão semiótica, cabível mas muito cabeça para as urgências das redes sociais, a respeito dos símbolos ressignificados pelo tempo e pelo contexto. Uma mesma bandeira do Brasil empunhada em um estádio de futebol encerra ideias distintas de uma bandeira usada como vestimenta em manifestações na Avenida Paulista.

A primeira exprime devoção a um time de futebol, independentemente do grau de sentimento patriótico de um torcedor que pode nem saber cantar o Hino Nacional mas que sairá às lágrimas se o seu time perder. A segunda, o pertencimento a um grupo político. Ao rejeitar o símbolo em espaço aberto, Bebel não profanava a bandeira em si, inquestionavelmente soberana, mas a ideia que lhe trazia.

Há tempos que artistas e bandeiras alimentam uma relação pública de amor e de ódio. Amor ou ódio não às cores ou formas desenhadas pelo filósofo e matemático Raimundo Teixeira Mendes logo após a Proclamação da República, em 1889, vale dizer cem vezes, mas às sensações que elas exprimem e que se transformam a cada revés histórico.

Em 18 de outubro de 1988, já fervendo em febre pela Aids e em rebeldia por entender que o Brasil de José Sarney não parecia mudar muito, Cazuza causou ao cuspir na bandeira do Brasil durante um show da turnê de seu álbum Ideologia, dirigido por Ney Matogrosso. Ainda não havia associação direta da bandeira com campos políticos definidos, mas sim com uma ideia geral de País.

Houve gritaria entre intelectuais e na própria classe artística, com o jornalista Humberto Saad reforçando que a Nação não deveria admitir tal ofensa. Cazuza escreveu sua resposta em uma carta e pediu ao pai, João Araújo, que a entregasse à imprensa, mas João resolveu poupar o filho doente e a guardou. Semanas depois da morte de Cazuza, em 1990, João levou a carta ao Globo.

Cazuza escreveu: “Está havendo uma polêmica, um escândalo, como diz o JB (Jornal do Brasil) de terça-feira, 18 de outubro, com o fato de eu ter cuspido na bandeira brasileira durante a música Brasil no meu show de domingo no Canecão. Eu realmente cuspi na bandeira, e duas vezes. Não me arrependo. Sabia muito bem o que estava fazendo, depois que um ufanista me jogou a bandeira da plateia”. Mais à frente, seguia: “Os jovens americanos queimavam sua bandeira em protesto contra a guerra do Vietnã”

E finalizava: “Eu sei muito bem o que é a bandeira do Brasil, me enrolei nela no Rock’n’Rio (em 1985) junto com uma multidão que acreditava que esse país podia realmente mudar. A bandeira de um país é o símbolo da nacionalidade para um povo. Vamos amá-la e respeitá-la no dia em que o que está escrito nela for uma realidade. Por enquanto, estamos esperando.”

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