Sábado, 08 de Novembro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 15 de setembro de 2023
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afirma ter encontrado irregularidades na homologação e na gestão dos acordos de colaboração e de leniência fechados na Operação Lava Jato. Uma auditoria no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4) e na 13.ª Vara Federal Criminal, berço da operação, aponta uma ‘gestão caótica’ no controle das multas negociadas com delatores e empresas.
A inspeção do CNJ também retoma uma polêmica antiga da Lava Jato: a proposta de criação de uma fundação que seria gerida com recursos oriundos de uma multa de R$ 2,5 bilhões paga pela Petrobrás em ação nos Estados Unidos. A força-tarefa desistiu do projeto após a repercussão negativa.
O CNJ afirma que magistrados e membros da força-tarefa tenham agido em ‘conluio’ para destinar as multas dos acordos de delação e leniência aos cofres da Petrobrás porque sabiam que o dinheiro seria usado pela estatal para pagar a multa no exterior e que parte desses recursos voltaria para o projeto da ‘Fundação Lava Jato’.
“Verificou-se a existência de um possível conluio envolvendo os diversos operadores do sistema de justiça, no sentido de destinar valores e recursos no Brasil, para permitir que a Petrobrás pagasse acordos no exterior que retornariam para interesse exclusivo da força-tarefa”, diz um trecho do relatório da inspeção.
A auditoria também afirma que os acordos de delação e leniência eram homologados sem informações sobre as ‘circunstâncias’ ou documentos envolvendo as negociações.
Já foram ouvidos na investigação do CNJ Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato em Curitiba; Eduardo Appio, juiz afastado da 13.ª Vara de Curitiba; Gabriela Hardt, juíza que substituiu Sérgio Moro na Lava Jato; Carlos Thompson Flores, Marcelo Malucelli e Loraci Flores de Lima, desembargadores do TRF4, além de advogados e servidores.
O relatório final do CNJ ainda está em produção, mas uma versão provisória, com as primeiras impressões de quem participou das visitas a Curitiba ao longo dos últimos dois meses, circula entre os conselheiros.
“O principal ponto do trabalho consistiu na identificação de ações e omissões que indicariam um agir destituído quanto ao zelo exigido dos magistrados nos processos”, diz um trecho do documento.
A equipe do ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional do CNJ, lidera a auditoria e já negocia com o Ministério da Justiça a criação de um grupo de trabalho para aprofundar a investigação e ampliar regras sobre acordos de delação e leniência. A ideia é convidar também representantes da Advocacia Geral da União (AGU), Controladoria Geral da União (CGU), Ministério Público Federal (MPF), Tribunal de Contas da União (TCU), Polícia Federal e Receita Federal.
Triangulação
O dinheiro que foi enviado à Petrobras pela Lava-Jato apenas para voltar como investimento em uma fundação de combate à corrupção faz parte dos R$ 3,1 bilhões que, em contas superestimadas pelo MPF curitibano, seriam “devolvidos aos cofres públicos”.
Já o acordo assinado entre a Petrobras e os procuradores da Lava-Jato para criação da tal fundação permitiria ao grupo de procuradores gerir recursos bilionários. Em troca, a estatal repassaria informações confidenciais sobre seus negócios ao governo norte-americano.
Para viabilizar esse trânsito de dinheiro, o então juiz federal Sergio Moro instaurou um procedimento de ofício com a justificativa de que os valores depositado em contas judiciais “estavam sujeitos a remuneração não muito expressiva”. E ao faze-lo, segundo o CNJ, desrespeitou a lei.
Moro não justificou a existência de algum grau de deterioração ou depreciação ou mesmo a dificuldade para a sua manutenção, como exige o artigo 144-A do Código de Processo Penal. Nem que a destinação imediata era necessária “para preservação de valor de bens”, como prevê ao artigo 4º-A da Lei 9.613/1998.
Assim, o dinheiro de acordos e leniências foi para contas judiciais vinculadas a quem não era parte na representação criminal. Esses valores foram tratados como “ressarcimentos cíveis” pelo juízo criminal, sem observância do critério legal de decretação de perda.
O repasse a Petrobras foi feito sem qualquer indício de que a empresa havia corrigido ou eliminado os problemas internos que haviam permitido a ocorrência dos crimes apurados pela “lava jato” e enquanto a mesma ainda era investigada pelo Ministério Público de São Paulo e por autoridades americanas.