Sábado, 27 de Dezembro de 2025

Home Brasil Controladoria-Geral da União aponta manobra contábil de R$ 1 bilhão nos Correios e vê fragilidade em ações judiciais

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A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou “fragilidades relevantes” nos mecanismos de controle dos Correios sobre ações judiciais e apontou uma manobra contábil que reduziu o passivo da companhia em R$ 1 bilhão nas demonstrações de 2023.

Em resposta aos auditores, a companhia negou irregularidades, embora tenha reconhecido outros problemas, que foram atribuídos à gestão da empresa durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Procurada pela Folha, a companhia não respondeu até a publicação deste texto.

Segundo o relatório da CGU, a estatal reduziu de R$ 1,032 bilhão para R$ 18 o valor de uma dívida trabalhista, sob a justificativa de que a chance de êxito em outra ação protocolada pela empresa geraria um ganho praticamente no mesmo valor. O problema persistiu em 2024.

O mecanismo de compensação, porém, foi considerado indevido pelos auditores, que viram no expediente uma forma de reduzir a transparência dos registros.

“Fatos contábeis distintos devem ser tratados de forma específica e independente, de modo a retratar de maneira fidedigna os impactos na situação patrimonial da entidade”, diz o documento.

“Portanto, embora a compensação possa ser um instituto jurídico possível, as normas contábeis aplicáveis não permitem que a evidenciação contábil seja realizada pelo valor líquido. […] Realizar uma operação de compensação entre elementos diferentes pode esconder o impacto de operações diferentes, reduzindo a transparência do registro.”

O descontrole dos Correios sobre as ações judiciais contribuiu para agravar a situação financeira da companhia, que agora fechou um empréstimo de R$ 12 bilhões para bancar seu plano de reestruturação. Até setembro deste ano, a estatal acumula um prejuízo de R$ 6,1 bilhões.

A operação questionada pela CGU envolveu uma ação trabalhista que reivindicava o pagamento cumulativo dos adicionais AADC (referente à atividade de distribuição e coleta) e AP (periculosidade para atividades de motocicleta).

Em 2014, com a regulamentação do adicional de periculosidade pelo Ministério do Trabalho, os beneficiários tiveram o AADC suspenso por decisão dos Correios, o que gerou uma enxurrada de ações. Pouco tempo depois, a própria estatal ingressou na Justiça Federal pedindo a nulidade do ato do Ministério do Trabalho.

Em 2021, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) reconheceu a legitimidade do acúmulo dos dois adicionais. No entanto, em janeiro de 2024, os Correios obtiveram uma liminar para suspender os efeitos da portaria que criou o adicional de periculosidade. Foi com base nesta última vitória que a empresa reduziu a provisão no balanço.

A CGU aponta pelo menos dois problemas relacionados à conduta dos gestores da companhia. O primeiro deles é a compensação em si, considerada indevida. O segundo antecede esse ato e tem relação com a demora dos Correios em mudar a classificação do risco judicial da ação trabalhista de “possível” (mais remoto) para “provável” (com mais chances de se concretizar), além da precariedade do cálculo dos valores.

Segundo os auditores, em outubro de 2022, houve uma decisão de manter a classificação equivocada da ação trabalhista. Além disso, na época, o passivo era contabilizado em R$ 614 milhões, ou seja, estava subavaliado. Apenas em fevereiro de 2023 a dívida foi reconhecida como “perda provável”, a um valor de R$ 627 milhões.

A CGU menciona no documento que a auditoria interna dos Correios “identificou fragilidades de controle no processo de contencioso trabalhista, fiscal e cível e indicou ainda o encaminhamento do assunto à corregedoria da estatal, para conhecimento e avaliação de eventuais instaurações de processos disciplinares”.

Procurados, os Correios não responderam sobre a existência ou não de processo na corregedoria para apurar o caso.

Em relação à compensação, os auditores afirmam que as duas ações transitam em ramos distintos da Justiça, além de persistirem incertezas quanto à vitória da empresa na ação sobre a nulidade da portaria.

Os técnicos ressaltam ainda que as normas contábeis preveem a contabilização de perdas prováveis no passivo de uma empresa, por uma questão de prudência, mas a inclusão de valores no ativo da mesma companhia requer um nível de incerteza muito menor —ou seja, o ganho precisa ser praticamente certo.

“Desse modo, ao se utilizar do mecanismo da compensação, a unidade está reconhecendo, de forma implícita, um ativo com características de ativo contingente, já que, no caso em análise, a efetivação da compensação está baseada em eventos futuros com nível de incerteza, o que é vedado pelas normas contábeis”, afirma o relatório da CGU.

 

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