Quarta-feira, 20 de Agosto de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 19 de agosto de 2025
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, decidiu que leis e determinações de outros países não têm validade automática no Brasil, por uma questão de soberania nacional. Na esteira desse processo, também proibiu instituições financeiras brasileiras de atender ordens de tribunais estrangeiros sem autorização expressa do STF.
Embora não cite diretamente a Lei Magnitsky — sanção dos EUA aplicada contra o ministro Alexandre de Moraes em julho —, essa parcela da decisão de Dino foi interpretada como uma resposta a ela, e levantou dúvidas sobre os impactos para bancos e empresas que operam no Brasil e no exterior.
Com a percepção de maior risco aos negócios, o impasse fez as ações dos bancos brasileiros caírem em bloco nesta terça. Especialistas explicam como a decisão do Supremo pode afetar as instituições financeiras brasileiras.
* Quais princípios jurídicos garantem a soberania brasileira diante de sanções e leis estrangeiras?
Em entrevista à GloboNews, o doutor em Direito Internacional pela USP Rabih Nasser afirmou que a decisão do ministro já está prevista na Constituição, e também trata do “princípio da territorialidade”.
“Ou seja, as leis de cada país valem dentro do seu território. Em situações excepcionais, podem até produzir efeitos fora dele”, diz o especialista.
Segundo Nasser, a decisão do ministro Flávio Dino, no caso da ação do Ibram, declarou sem efeito uma medida de um tribunal inglês, tomada em março deste ano.
“Ele entendeu que houve violação da soberania nacional, já que municípios brasileiros estavam litigando em tribunal estrangeiro, embora façam parte do Estado brasileiro. Por isso, afirmou que eles devem litigar aqui, no Brasil, porque os fatos ocorreram aqui”.
* Empresas e bancos brasileiros com negócios nos EUA são obrigados a cumprir a Lei Magnitsky?
Charles Nasrallah, advogado especializado em direito empresarial, avalia que a decisão do STF de barrar determinações estrangeiras no Brasil cria um conflito.
“Na teoria, bancos e empresas devem obedecer à lei brasileira. Na prática, para operar no mercado internacional, ninguém pode simplesmente ignorar a legislação dos EUA, que controla o sistema financeiro global”, afirma.
Segundo ele, o Supremo adotou uma decisão que pode soar nacionalista, mas que, na prática, coloca as empresas brasileiras em uma encruzilhada difícil de resolver.
Para Marcos Camilo, CEO da Pulse Capital, a legislação americana — incluindo a Lei Magnitsky — não tem aplicação imediata no Brasil. “O país mantém sua soberania nacional. Uma lei ou decisão estrangeira precisa ser validada em território brasileiro para ter eficácia”, afirma.
Ele ressalta que autoridades dos EUA podem sancionar empresas brasileiras apenas em território americano, em caso de descumprimento de leis ou decisões locais. “O Brasil não é obrigado a aplicar medidas estrangeiras em seu território”.
* De que forma a decisão e a Lei Magnitsky podem afetar instituições financeiras brasileiras?
Rabih Nasser acredita que as empresas precisarão continuar medindo riscos e definindo o que podem ou não fazer conforme a legislação de cada país — sobretudo nos EUA.
“Em princípio, as sanções dos EUA valem apenas para empresas americanas. Ou seja, cidadãos e companhias dos EUA não podem se relacionar com a pessoa sancionada, e as restrições podem atingir transações que passem pelo sistema financeiro americano.”
Já Eduardo Terashima, doutor em relações internacionais econômicas e sócio da NHM Advogados, alerta que o descumprimento de normas internacionais pode gerar consequências severas para as empresas no cenário global, como: bloqueio de ativos no exterior, restrições de acesso a sistemas de pagamento em dólar e aumento do custo de captação fora do país.
* Bancos e empresas que atuam em vários países devem seguir qual legislação?
De acordo com o advogado Daniel Toledo, especialista em direito internacional, empresas que atuam em vários países devem seguir a legislação de cada território. Uma companhia que faz negócios nos EUA deve respeitar a lei americana, enquanto uma brasileira precisa cumprir as normas nacionais.
“O mesmo vale para operações na Rússia ou em qualquer outro país, sempre considerando os tratados internacionais em vigor”, afirma Toledo.
* O Brasil pode ser excluído do sistema financeiro internacional se empresas descumprirem leis estrangeiras?
A exclusão de um país do sistema SWIFT é vista como uma medida extrema, adotada apenas em situações excepcionais — como ocorreu com Rússia e Irã.
O SWIFT é uma rede global que garante comunicação segura entre instituições financeiras e facilita transferências internacionais. Funciona como um sistema de mensagens para instruções de pagamento, sem gerenciar ou reter fundos. Mais de 11 mil instituições em mais de 200 países utilizam o SWIFT.
* A decisão fere acordos internacionais ou tratados multilaterais?
Em novo despacho, o ministro Flávio Dino reafirmou a validade da decisão, esclarecendo que sua determinação não se aplica aos chamados tribunais internacionais.
Como o Brasil não é signatário de tratados internacionais que o obriguem a adotar a legislação sancionatória dos EUA, a decisão do STF não viola acordos internacionais.
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