Home Colunistas É preciso saber envelhecer

A vida começa como uma doce promessa. Na infância, tudo é um sonho. O mundo parece infinito e maravilhoso, e os dias são longos e divertidos, pois acreditamos que podemos ser qualquer coisa quando crescermos: astronauta, jogador de futebol, cantor, médico, herói de gibi etc.

Não existe pressa. A inocência é o combustível, e a esperança é nosso horizonte.

Então, crescemos… E a juventude chega como uma verdadeira tempestade avassaladora. E, com ela, a urgência. Queremos tudo para ontem, como se a vida fosse um estoque limitado de oportunidades, que sobrevivem apesar de toda a nossa imprudência, que muitas vezes faz com que escapem pelas nossas mãos.

É nessa fase que confundimos velocidade com conquista e acreditamos que a felicidade mora num futuro promissor, sempre no próximo emprego, no próximo amor, na próxima festa, na próxima oportunidade.

Mas, na maioria das vezes, esquecemos de viver o presente, porque estamos ocupados demais perseguindo a perfeição, e até mesmo aquilo que ainda não existe.

Transição para a maturidade

Na maturidade, aprendemos o verdadeiro valor da vida. Descobrimos que o tempo é o bem mais precioso que temos e que a felicidade verdadeira não está nas grandes vitórias, ao contrário do que pensávamos, mas nas pequenas coisas que negligenciamos no passado e até mesmo no nosso dia a dia: um bom café compartilhado, um abraço sincero, o silêncio de um fim de tarde, a companhia perfeita de quem ficou.

É aqui que começamos a entender que, algumas vezes, certos jargões têm um fundo de verdade. Que o menos pode mais…

Que a simplicidade é riqueza e que nem todo peso precisa ser carregado sozinho.

O moço velho

Toda essa reflexão me fez lembrar de uma música que eu costumava ouvir quando era criança, “O moço velho”, de Roberto Carlos. Para mim, uma das suas obras mais poéticas.

Mesmo sendo uma criança, eu me identificava tanto com essa música, mesmo sem ter vivido nenhuma experiência. E, agora, ela parece que foi escrita para mim.

Em uma de suas estrofes, ele canta: “Eu sou um moço velho, já viveu muito, já sofreu tudo, e já morreu cedo”.

Colocando tudo isso em minhas próprias palavras, creio ser alguém marcado pelo tempo e pelas lutas, mas que guarda no peito o espírito da juventude intacto, como se ainda tivesse vinte anos.

Ainda parafraseando Roberto Carlos: “Eu, simplesmente eu, sou um homem, que ainda crê no amor”.

Então, finalmente ela chega… A velhice chega sem que a gente perceba, é como uma estação silenciosa. Ela não nos traz apenas algumas rugas de expressão, ou dores no corpo, mas também memórias que passam a ser a essência de nossa existência, e muitas vezes a razão de nosso viver.

Guardamos nossas histórias em cada linha do rosto e lembranças em cada olhar demorado, as histórias maravilhosas que carregamos em nossa memória.

O corpo já não pode caminhar tão rápido, é preciso ir mais devagar, mas a mente aprende a caminhar com firmeza e com a convicção de quem já viu quase tudo nesse mundo.

Já não nos importamos mais em agradar a todos porque entendemos que o verdadeiro luxo da vida é ser autêntico. Mas, para se conquistar essa liberdade, foi necessário batalhar muito na juventude, para não se tornar refém de terceiros no futuro.

Tudo que nos resta, e não é pouco, são nossas doces lembranças e as muitas histórias que ainda temos para contar.

Envelhecer não é perder. É transformar o tempo em memória dividida, é descobrir que a vida nunca esteve nas coisas que acumulamos, mas nas pessoas, nos afetos, nas marcas invisíveis e indeléveis que deixamos no mundo e no coração de outras pessoas.

* Fabio L. Borges, jornalista e cronista gaúcho