Domingo, 23 de Novembro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 23 de novembro de 2025
A prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro, às vésperas do fim dos prazos para entrar com recursos contra a condenação no caso da trama golpista, tende a antecipar um cenário considerado desafiador por seus aliados: o de se organizar para as eleições de 2026 sem sua principal liderança à frente dessas tratativas. Cientistas políticos e antropólogos que estudam a evolução do bolsonarismo desde 2018 afirmaram ao GLOBO que a maior privação de liberdade, devido à prisão na superintendência da Polícia Federal, pode afetar o papel de Bolsonaro como cabo eleitoral e aumentar o risco de fragmentação de seu campo.
Na avaliação dos especialistas, o ex-presidente “perdeu o timing” da definição de um sucessor, o que ameaça a própria permanência do termo “bolsonarismo” para caracterizar a oposição ao governo Lula (PT). Eles indicam que a agenda de costumes tende a seguir importante para a direita, assim como na eleição de 2018, mas que a segurança pública pode ganhar mais relevância, a depender do nome que disputar a Presidência.
1. Preso, Bolsonaro conseguirá manter a mobilização da sua base?
A cientista política Camila Rocha, diretora do Centro para Imaginação Crítica do Cebrap, afirma que a presença física de Bolsonaro já se mostrava relevante, por exemplo, para atrair público em manifestações bolsonaristas. A passagem da prisão domiciliar para o regime fechado, se confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao fim do julgamento dos recursos do ex-presidente, pode acentuar uma sensação de que sua imagem está “sumindo”.
— Quando Lula estava detido em 2018, também em uma superintendência da PF, ele estava fisicamente bem de saúde, as pessoas tinham acesso, ele deu entrevistas. Em relação a Bolsonaro, a situação é diferente. Ele não está do ponto de vista de saúde muito bem e não parece haver um grande apoio internacional, por parte de outras lideranças, em relação a uma possível libertação — comparou a pesquisadora.
Essa dificuldade para mobilizar a base já vinha aparecendo, na avaliação de especialistas, desde a decretação da prisão domiciliar de Bolsonaro, em agosto. Além de restringir a capacidade de encontro com aliados, aquela decisão também reforçou a impossibilidade de que Bolsonaro usasse as redes sociais.
Os pesquisadores lembram que Bolsonaro e os filhos usaram as redes de forma estratégica, desde a campanha eleitoral de 2018, para popularizar a imagem do ex-presidente e manter um canal direto entre ele e apoiadores.
Segundo o antropólogo David Nemer, professor na Universidade de Virgínia, nos EUA, que monitora grupos de WhatsApp usados por militantes bolsonaristas, o número de menções diretas ao ex-presidente vinha caindo nesses fóruns desde a prisão domiciliar. O pesquisador afirma que alguns picos de menções a Bolsonaro, nesse período, estavam relacionados à “esperança de que alguma reviravolta pudesse acontecer em relação à prisão”, como quando o ministro do STF Alexandre de Moraes foi alvo de sanções dos EUA.
Professora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, a antropóloga Isabela Kalil já vem detectando vídeos com inteligência artificial, em redes sociais como o TikTok, que tentam recriar a imagem do ex-presidente.
2. A prisão eleva ou reduz a importância do apoio de Bolsonaro na urna em 2026?
O cientista político Guilherme Casarões, um dos coordenadores do Observatório da Extrema-Direita, avalia que a manutenção de Bolsonaro como cabo eleitoral para presidenciáveis de direita dependerá da forma como o entorno do ex-presidente lidar com a mudança de prisão domiciliar para o regime fechado.
— Se a prisão de Bolsonaro levar a uma radicalização ainda maior das posições do bolsonarismo, sobretudo no que diz respeito à democracia, o movimento se tornará insustentável para setores da direita que pretendem se manter no jogo político-eleitoral. Uma “martirização” de Bolsonaro, sem radicalização, pode ser o caminho para manter a direita unida diante das eleições do próximo ano – avalia Casarões.
3. Bolsonarismo sobrevive, como fenômeno eleitoral, sem Bolsonaro?
Para os especialistas, a ideia de um campo “bolsonarista” dependerá da capacidade de familiares do ex-presidente se colocarem como sucessores. Eles traçam um paralelo com o “peronismo”, que se firmou como movimento político na Argentina a partir das presidências de Juan Domingo Perón e da atuação da ex-primeiras-damas Evita e Isabelita.
O cientista político Guilherme Casarões avalia que o bolsonarismo tem “natureza populista”, portanto, “é natural que siga girando em torno de uma figura”.
— Por isso, há uma insistência de setores do campo bolsonarista em manter alguém da família à frente do movimento. Isso indica certa fragilidade, uma vez que não parece haver ninguém fora do círculo íntimo de Bolsonaro que possa exercer uma liderança de longo prazo. Com informações do portal O Globo.