Segunda-feira, 03 de Novembro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 2 de novembro de 2025
A circulação de armas de grosso calibre no Rio de Janeiro ajuda a explicar a alta letalidade da operação que matou 121 pessoas na terça-feira (28) no Rio de Janeiro. Enquanto a compra de armas diminui no Brasil, o número de fuzis vai na direção inversa, em especial no Estado fluminense.
Apenas neste ano, a polícia do Rio de Janeiro apreendeu 593 fuzis, 285 a mais do que São Paulo, segundo colocado com 310. As outras 25 unidades da Federação somadas apreenderam 568 de armas – menos do que o Rio sozinho.
Na série histórica de 10 anos, o Rio descola do resto do Brasil e, por vezes, supera a soma de todos os Estados, como em 2017, 2018 e 2019. As apreensões no país cresceram 209% na década, e quase metade do volume (45,2%) veio do Estado fluminense, onde o número mais que dobrou.
Os dados são das Secretarias de Segurança Pública dos Estados compilados pelo Ministério da Justiça.
Esse tipo de arma muda a tática das operações e impacta a letalidade. O fuzil atinge o alvo a grandes distâncias, tem muita precisão e faz a bala chegar com forte impacto, penetrando coletes de proteção. Também aumenta a chance de morte e de sequelas, como amputações. A bala atravessa paredes com facilidade, elevando o risco para moradores em locais de conflito.
Com calibres projetados para uso em combate militar, eles são restritos em muitos países e usados para combates prolongados, como o tiroteio que ocorreu nos complexos da Penha e do Alemão (na zona norte do Rio) por 12 horas. No Brasil, a venda desse tipo de armamento é proibida pra defesa pessoal e restrita a algumas categorias de CACs (caçadores, atiradores e colecionadores), além das autoridades de segurança pública.
Parte do arsenal que circula no Brasil é contrabandeada pelas fronteiras, mas especialistas alertam para a alta na apreensão das chamadas “armas fantasmas”, montadas no país sem número de identificação, e das “armas Frankenstein”, que misturam peças de diferentes fabricantes de kits comercializados de forma legal no exterior.
“Nos Estados Unidos, esses kits de peças e componentes podem ser vendidos sem identificação. Aqui, as pessoas juntam as armas a partir dessas peças industriais, mas sem número de série. É possível encomendar esses kits online no fabricante americano”, afirma Natália Pollachi, diretora de projetos do Sou da Paz. Ela diz que uma arma Frankenstein pode ter números de série diferentes, uma na armação e outra no cano, por exemplo.
Pollachi é uma das responsáveis por um relatório do Sou da Paz, com dados de 2019 a 2023, que identifica três fontes ilegais das armas de fogo de uso militar: tráfico pelas fronteiras, montagem no Brasil e desvio do arsenal das forças públicas.
O estudo indica declínio nas apreensões de revólveres e aumento nas pistolas semiautomáticas no período analisado. As espingardas também perderam espaço para os fuzis. No mercado ilegal, segundo ela, um único fuzil vale entre R$ 30 mil e R$ 60 mil.
As armas sem identificação de diferentes calibres, como a fantasma e a Frankenstein, ultrapassam 95 mil apreensões desde 2019, uma média de 39 por dia. Isso representa 11,3 vezes a apreensão de fuzis identificados.
A Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro (SSP-RJ) não divulgou modelos, calibres e fabricantes das armas apreendidas na Operação Contenção, mas especialistas esperam que ao menos uma parte se classifique como “não identificada”.
Apesar de tantas armas serem montadas em território nacional, inundando o mercado ilegal com armas pesadas de diferentes calibres, essa linha de investigação é muitas vezes negligenciada pelas autoridades, segundo Pollachi.
“O que sabemos é que essa dinâmica está crescendo rapidamente, isso acende um alerta importante. Mas não sabemos a quantidade nem a escala dessas linhas de montagem”, afirma. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.