Quinta-feira, 09 de Outubro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 8 de outubro de 2025
O sistema imunológico protege o organismo de vírus e bactérias, mas também pode, em certas situações, voltar-se contra ele. Entender como o corpo impede que isso aconteça foi o foco das pesquisas que renderam o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2025. O reconhecimento foi concedido aos cientistas Mary Brunkow, 63, Fred Ramsdell, 64, ambos dos Estados Unidos, e ao japonês Shimon Sakaguchi, 74.
O trio foi premiado pela identificação e descrição das células T reguladoras, ou Treg — um tipo de linfócito responsável por controlar a atividade do sistema imunológico e evitar que ele ataque tecidos saudáveis.
Essas células são uma espécie de “freio biológico” do sistema de defesa. Elas permanecem ativas para impedir reações exageradas, evitando que o corpo destrua suas próprias células. Segundo Jonathan Fisher, imunologista da University College London, essa descoberta representa uma das maiores contribuições recentes para a compreensão das respostas imunológicas humanas.
Sakaguchi foi o primeiro, nos anos 1990, a comprovar a existência dessas células. Já Brunkow e Ramsdell, no início dos anos 2000, identificaram o gene essencial para o funcionamento das Treg. Elas fazem parte da família dos linfócitos T, células geradas no timo — órgão situado na parte superior do tórax — que aprendem a distinguir o que pertence ou não ao organismo.
Mesmo após essa seleção inicial, o sistema imunológico poderia facilmente sair de controle. É aí que entram as células reguladoras, que produzem substâncias capazes de inibir a ação dos chamados linfócitos “assassinos”, responsáveis por eliminar invasores. “Elas atuam como moderadoras, acalmando a resposta imunológica quando ela se torna excessiva”, explica Divi Cornec, pesquisador do Instituto Nacional de Saúde e Medicina da França.
A descoberta tem implicações diretas para o entendimento e o tratamento das doenças autoimunes — como lúpus, artrite reumatoide e esclerose múltipla —, nas quais o corpo confunde células próprias com invasoras. Estudos mostram que pacientes com falhas nas células T reguladoras tendem a apresentar quadros mais graves dessas enfermidades.
Por outro lado, quando essas células atuam em excesso, podem impedir que o sistema imunológico reaja de forma adequada, permitindo o avanço de tumores ou dificultando a eliminação de infecções persistentes. É o que se observa em alguns tipos de câncer, nos quais há grande concentração de Treg nos tecidos tumorais. Há ainda suspeitas de que elas possam estar envolvidas na manutenção de sintomas de doenças como a covid longa, embora essa hipótese ainda esteja em investigação.
Outro campo promissor é o dos transplantes de órgãos. As células reguladoras parecem desempenhar papel importante na prevenção da rejeição, o que pode abrir caminho para terapias mais seguras e duradouras.
Com base nesses avanços, pesquisadores buscam maneiras de manipular as Treg em laboratório para criar novos medicamentos. No caso das doenças autoimunes, o objetivo seria estimulá-las ou introduzi-las no corpo para restaurar o equilíbrio do sistema. Já na oncologia, o desafio é o oposto: bloquear sua ação quando ela protege tumores contra o ataque imunológico.
Apesar do entusiasmo, os especialistas afirmam que ainda há um longo caminho até que esses estudos resultem em tratamentos eficazes. “Compreender o sistema imunológico é uma coisa; conseguir manipulá-lo de forma segura e previsível em humanos é algo bem mais complexo”, observa Fisher.