Quinta-feira, 25 de Setembro de 2025

Home Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues Gaúchos: forjados na chama das revoluções

Compartilhe esta notícia:

Do farrapo ao maragato, a memória de um povo aguerrido que hoje empunha novas armas em defesa da liberdade

Setembro é o mês em que o Rio Grande se veste de lembrança. Bandeiras tremulam, churrascos fumegam e pilchas ressurgem como brasões vivos, mas, acima de tudo, é o tempo de revisitar a alma do povo gaúcho, marcada por lutas, derrotas e façanhas que moldaram sua identidade.

A saga começa nos Farrapos, quando homens maltrapilhos, de roupas em farrapos, cavalgavam sob sol e geada. Não era apenas guerra: era uma declaração de que, mesmo diante de um império poderoso, o gaúcho preferia enfrentar a morte a abrir mão da liberdade. Em Seival, com a Proclamação da República Rio-Grandense em 1836, dois países duelaram por uma década, até o Tratado de Ponche Verde.

Naquela revolução, Maçonaria e ideias liberais atravessavam as fronteiras. Bento Gonçalves, Gomes Jardim e outros insurgentes encontravam eco no republicanismo americano e nos ideais de Garibaldi. Do outro lado, o Duque de Caxias defendia a ordem imperial. Entre os heróis anônimos estavam os Lanceiros Negros — escravos prometidos à liberdade que, com lanças em punho, abriam caminho às tropas farrapas. Traídos, foram dizimados em Porongos, mas deixaram à posteridade o símbolo maior: esperança de liberdade. Foram dez anos de fogo contido, mais diplomacia que sangue, mas sempre resistência.

Já a Revolução Federalista foi diferente. Dois anos apenas (1893-1895) e um banho de sangue sem precedentes: doze mil mortos, a degola como assinatura cruel, a “gravata maragata” como terror e aviso. Os maragatos, herdeiros de um nome espanhol que lembrava os camponeses de León, enfrentavam a República Velha centralizadora em defesa do federalismo. Não eram apenas soldados: eram caudilhos, líderes carismáticos de sua gente, homens que sabiam comandar não pela lei escrita, mas pela palavra forte e pela coragem no campo.

É nesse cenário que surge a figura de José Seraphim de Castilhos, o lendário Juca Tigre, meu trisavô. Maragato convicto, ergueu-se ao lado de Gumercindo Saraiva e Honório Lemes, o Leão do Caverá. Não lutava contra estrangeiros, mas contra seu próprio primo, Júlio de Castilhos. Sangue contra sangue, primo contra primo, como se o destino insistisse em ensinar aos gaúchos que a bravura cobra caro quando a batalha é dentro de casa. Juca Tigre viveu e morreu como símbolo do destemor, deixando para sua descendência a marca indelével da resistência e da coragem.

As histórias do Sul não estão isoladas. A insurreição grega contra o Império Otomano, a Guerra Carlista na Espanha, a Guerra de Secessão nos Estados Unidos — em cada uma delas o eco do mesmo espírito: povos que, quando sentem a autonomia ameaçada, enfrentam gigantes em nome da liberdade. O gaúcho não é exceção, é apenas mais um capítulo desse livro universal da resistência.

Mas o que fazer hoje, passados mais de cem anos? Já não há lanças, nem degolas, nem tratados costurados sob lonas de campanha. As armas mudaram: agora são a palavra, a cidadania, a consciência. Hoje, ser caudilho é erguer a voz contra a injustiça, não o punhal contra o vizinho. É empunhar a espada da justiça, não a adaga da vingança. É transformar o verbo em lança, a razão em trincheira, a democracia em campo de batalha.

O povo gaúcho continua sendo forjado na luta, mas agora a arena é outra. A bravura, que antes se media em sangue, hoje deve se medir em dignidade, ética e construção de um futuro comum. Porque, como canta nosso hino, “sirvam nossas façanhas de modelo a toda a Terra”. E façanhas, neste tempo, não são mais degolas nem cercos: são gestos de cidadania, de união e de coragem para enfrentar os desafios de um mundo que ainda precisa de homens e mulheres aguerridos e bravos.

 

Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues
Advogado, escritor e trisneto de José Seraphim de Castilhos — o caudilho maragato Juca Tigre

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues

Presidente do STF e CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, prestigia em Santa Vitória do Palmar a inauguração do Centro de Justiça pioneiro no Brasil
Nova ideia de jerico de ministro preocupa prefeitos
Deixe seu comentário
Pode te interessar

Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues José Bonifácio: o patriarca que sonhou o Brasil

Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues Romualdo e outros amores de garagem

Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues Advogar: a luta de paixões que mantém a Justiça viva

Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues Depois do Diagnóstico: a Vida Ganha Novas Cores

Baixe o app da RÁDIO Pampa App Store Google Play
Ocultar
Fechar
Clique no botão acima para ouvir ao vivo
Volume

No Ar: Programa Pampa Na Tarde