Quarta-feira, 23 de Julho de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 23 de julho de 2025
Entes públicos – União, Estados e municípios – têm o dobro de chance de vencer casos tributários, previdenciários ou financeiros no Supremo Tribunal Federal (STF) do que o setor privado. Enquanto o recurso dos contribuintes foi aceito em 26% das vezes entre 2008 e 2024, a taxa de sucesso dos governos foi de 50%. Ao todo, no período, os entes públicos venceram 62% dos julgamentos, por meio de recursos próprios ou da outra parte. E mesmo quando perderam, a derrota foi amenizada: os ministros aplicaram a modulação dos efeitos em 68% dos casos de alto impacto fiscal para restringir o rombo nas contas públicas.
A inclinação favorável ao setor público é mais evidente quando a situação fiscal do País não é boa – quando há déficit no resultado primário. Essa correlação começou a ser vista em 2014, quando o país entrou em crise fiscal e passou a gastar mais do que arrecada. Naquele ano, o déficit foi de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB).
O auge na taxa de vitórias dos entes federativos foi em 2018, um ano após a aprovação do teto de gastos. Houve novo impulso em 2020, com a pandemia da covid-19, quando o déficit da União aumentou para 9,8% do PIB, o pior da história. Quando houve melhora nesse indicador, em 2022, levando a um superávit de 0,5% em relação ao PIB (mesmo que circunstancial, na visão de economistas), os governos venceram menos.
Essa tendência não é partidária e sim estrutural: persiste desde o governos de Dilma Roussef, Michel Temer, Jair Bolsonaro e no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No governo Dilma, a média de vitórias no STF foi de 51,9%. Quando Temer ocupava o cargo, essa taxa subiu para 68,4%. Na gestão Bolsonaro, houve leve recuo para 65,8%, chegando a 55,9% no terceiro mandato de Lula, até então.
As informações estão no estudo “O Judiciário como instrumento de política fiscal? Estresse orçamentário e tomada de decisões judiciais no Brasil”, publicado no início do mês pela revista Public Choice. A pesquisa foi conduzida pelo advogado, economista e pós-doutor em Matemática Eduardo Mattos, da OX Analytics, a partir do uso de modelos de estatística e machine learning – técnica de inteligência artificial que usa algoritmos para fazer previsões e identificar padrões em dados.
O estudo levou em conta decisões tomadas em recursos com repercussão geral, isto é, que devem ser seguidas por todo o Judiciário, e ações de controle concentrado, como ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs). A pesquisa começa em 2008, pois foi o primeiro ano em que houve decisão em repercussão geral. Foram excluídos os casos repetidos e discussões entre os entes federativos. Com esses filtros, a base de dados ficou com 358 processos – 252 em repercussão geral e 106 ADIs.
Para o pesquisador, o estresse no orçamento é um fator determinante nas decisões. “Os julgamentos são mais favoráveis quando a situação fiscal brasileira piora”, diz. “A taxa de vitória começou a crescer em 2013, atingindo o pico em 2018, depois que foi aprovado o pacote de teto de gastos e o país estava com uma sensibilidade política para a questão fiscal. Depois disso, nunca caiu para o padrão de 2013”, acrescenta Mattos, lembrando que há déficit desde então – exceto em 2022, mas há controvérsia.
Na visão dele, isso faz com que o Judiciário seja um componente de ajuste fiscal e valide políticas fiscais de interesse dos governos. “Se você conjuga todos esses elementos, que o Estado ganha o dobro de vezes e dois terços das decisões são moduladas em casos de alto impacto, parece que o STF funciona hoje como uma garantia para a execução da política fiscal. Se ela for mal feita, tem chance de ser mantida no Judiciário. E se não for mantida, provavelmente vai ser modulada”, afirma.
Essa expectativa de vitória, diz, dá um certo conforto para o Estado. “Sinaliza o que para o Executivo? Faça essa política. Ou vou mantê-la ou vou limitar os efeitos ruins para segurar o tamanho do problema.” O pesquisador explica que considerou o resultado primário acumulado nos 12 meses anteriores à data de julgamento dos casos para chegar à conclusão. As informações são do jornal Valor Econômico.
No Ar: Pampa Na Tarde