Quarta-feira, 10 de Dezembro de 2025

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O IARGS (Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul), por meio do Departamento de Psicologia Judiciária, realizou, no dia 9 de dezembro, a palestra gratuita e presencial “Trauma oculto: quando a violência psicológica se torna uma questão jurídica”, na sede do Instituto. A atividade foi realizada pelo Prof. Dr. Jorge Trindade, advogado, psicólogo e diretor do Departamento de Psicologia Judiciária do IARGS.

O encontro reuniu autoridades, associados, advogados e psicólogos. Entre as autoridades presentes estavam a presidente do IARGS, Sulamita Santos Cabral; a vice-presidente, Liane Bestetti; o desembargador federal José Luiz Borges Germano da Silva; e o desembargador e escritor Carlos Saldanha Legendre. A iniciativa integra a programação do Departamento, que vem abordando temas relacionados à saúde mental, violência psicológica e suas repercussões jurídicas.

Durante a exposição, o Dr. Jorge Trindade, pós-doutor em Psicologia Forense, doutor em Psicologia e em Ciências Sociais, apresentou reflexões sobre como traumas psicológicos podem gerar efeitos físicos e emocionais significativos, muitas vezes não reconhecidos de imediato. Ele mencionou a teoria do pesquisador Otto Rank, “pouco lembrado pela literatura atual”, segundo a qual o parto seria o primeiro trauma vivido pelo ser humano, podendo influenciar a forma como traumas posteriores são percebidos ao longo da vida.

Os efeitos traumáticos foram descritos pelo palestrante a partir dos sinais que o corpo e a mente expressam, tradicionalmente chamados de sintomas pela psicologia e pela psicopatologia. Dores de cabeça, ansiedade, insônia, desconfortos gástricos, indisposição e medo foram citados como manifestações que revelam as consequências do trauma, e não o trauma em si: “a Psicologia busca interpretar o que o sintoma significa, investigando a causa emocional e não o sintoma”. Dr. Jorge referiu ainda a “ideia equivocada” de que traumas psicológicos não deixam marcas. Ele explicou que, além das repercussões emocionais, experiências intensas podem produzir efeitos físicos perceptíveis.

Outro ponto tratado na palestra foi a dificuldade de lidar com a memória traumática. Em muitos casos, relatou, o problema não está em esquecer, mas em não conseguir interromper as recordações. “Esse fenômeno, denominado hipermnésia, faz com que o evento continue repercutindo internamente, mesmo anos após sua ocorrência”, explicou, acrescentando que muitos traumas não são públicos. Segundo ele, permanecem silenciosos por medo, vergonha ou receio das reações alheias, e podem gerar sintomas persistentes semelhantes a “cinzas que parecem frias, mas cujo fogo ainda não se apagou”.

Entre os traumas chamados de ocultos, citou vivências que não necessariamente envolvem grandes acontecimentos, mas situações sutis e contínuas, como negligência emocional, rejeição, invalidação afetiva, perdas familiares, conflitos domésticos, palavras duras, gestos inesperados ou toques inadequados, além de formas mais expressivas de violência física ou sexual.“O impacto dessas experiências é subjetivo e varia conforme a história de vida e a estrutura psíquica de cada pessoa”, salientou.

Ao abordar o ponto em que o trauma se transforma em questão jurídica, Dr. Jorge Trindade explicou que isso ocorre quando a experiência traumática gera dano, especialmente o psíquico: “para ser reconhecido judicialmente, o dano deve ser identificado, mensurado e comprovado. A maior dificuldade está em demonstrar o nexo de causalidade entre o evento traumático e suas consequências emocionais, etapa considerada uma das mais complexas no campo jurídico”. De acordo com ele, a responsabilização só se consolida quando fica estabelecido que determinado comportamento produziu efeitos com casualidade na vida da vítima.

Também ressaltou a profundidade e a persistência dos traumas emocionais, “que podem comprometer áreas essenciais da existência, incluindo a vida profissional, afetiva e social”. Medos intensos, angústia persistente, depressão profunda, isolamento e dificuldades de manter relações estáveis foram mencionados pelo Doutor em Psicologia como consequências capazes de limitar significativamente a vida cotidiana.

“Traumas expostos publicamente e aqueles guardados em silêncio produzem impactos que podem dificultar a construção de uma vida funcional e satisfatória”, acentuou.
O encerramento da palestra enfatizou a importância da palavra no processo de elaboração emocional: “A fala, ao permitir a expressão e o compartilhamento do sofrimento, tem impacto direto no cérebro e atua em circuitos neurais semelhantes aos estimulados por alguns tratamentos medicamentosos, ainda que de forma mais lenta”.

Destacou, na oportunidade, que a expressão verbal, por meio de uma consulta psicológica, pode aliviar o peso das experiências traumáticas, reforçando que “um trauma partilhado, uma dor partilhada, sempre é uma dor menos sofrida”.

Para finalizar, observou que, em uma sociedade marcada por julgamentos rápidos e forte polarização, muitas pessoas se sentem impedidas de se expressarem, o que agrava os chamados “traumas ocultos”. A ética do cuidado, afirmou, tende a enfraquecer quando o ambiente dificulta a expressão emocional e o acolhimento. A palestra foi concluída com a lembrança de uma máxima frequentemente citada: “aquilo que se cala, o corpo fala”.

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