Quinta-feira, 04 de Setembro de 2025

Home Colunistas O obstáculo invisível

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Entre 1930 e 1980, o Brasil foi uma das economias que mais cresceram no mundo. De lá para cá, alternamos avanços e crises, convivendo com baixo crescimento e perda de relevância frente a outros emergentes. Costuma-se atribuir essa trajetória a problemas já conhecidos: planejamento errático, Estado inchado, pouco investimento em educação e baixa inserção internacional. Mas há uma causa menos mensurada, debatida e ainda mais decisiva: a ausência de estabilidade política capaz de sustentar reformas que enfrentem privilégios.

Estabilidade, aqui, não quer dizer ausência de conflito, mas previsibilidade de regras, continuidade de políticas públicas e capacidade de execução para além do calendário eleitoral. Sem isso, tanto o modelo asiático, baseado em planejamento com forte presença estatal, quanto o modelo liberal, ancorado em abertura e competição, ficam inviáveis. O Brasil, conforme já destaquei neste espaço, tem falhado nos dois modelos, pois não conseguiu até hoje bem planejar e orientar sua economia, como tampouco implementou uma abertura comercial eficiente.

O presidencialismo de coalizão brasileiro degenerou e hoje é obstáculo ao nosso desenvolvimento, pois foi capturado por grupos de interesse, espelhado na prática das “emendas secretas”. A governabilidade passou a depender da liberação de recursos orçamentários no varejo, em negociações que pouco dialogam com produtividade, inovação ou competitividade. O Presidente se torna refém de um Congresso que responde a incentivos imediatistas, voltados à sobrevivência política, e não a uma agenda de Estado. Além disso, temos vigente um capitalismo de compadrio, avesso à maior abertura comercial, beneficiário de bondades tributárias do Estado e pouco exposto à competição externa.

Nesse arranjo, reformas estruturais que exigem enfrentar interesses estabelecidos não prosperam. A elite econômica continua pagando relativamente pouco sobre renda e patrimônio, enquanto castas do alto funcionalismo preservam supersalários e vantagens acumuladas. O resultado é uma carga tributária que penaliza consumo e trabalho, e um gasto público que nem reduz desigualdade nem eleva produtividade.

Não faltam diagnósticos nem propostas. Falta capacidade política de mantê-las ao longo do tempo. A cada troca de governo, reconfiguram-se feudos e redes de proteção; a cada rodada orçamentária, recria-se o balcão de barganhas. O Brasil permanece, assim, em um ciclo de “reformas sem reforma”, em que muito se debate e pouco se concretiza.

O ponto de partida não é uma grande invenção econômica, mas a construção de estabilidade política. Isso significa impor critérios transparentes e avaliáveis para emendas parlamentares, revisar gastos tributários que não cumpram metas, pôr fim a supersalários no serviço público e simplificar o sistema tributário com mais progressividade. Significa também reduzir a fragmentação partidária, regular de forma moderna o lobby e instituir metas nacionais de produtividade com vigência decenal, blindadas contra mudanças eleitorais.

Estabilidade política reduz incertezas, alonga horizontes e destrava investimentos de longo prazo. Mais que isso, cria coalizões voltadas a resultados, e não apenas à preservação de rendas. O país deixa de discutir quem ganha ou perde com cada reforma e passa a discutir o quanto cresce porque elas se mantêm.

O obstáculo, portanto, não é somente técnico, mas político. Exige que o presidente deixe de ser refém, que o Congresso deixe de ser feudo e que elites econômicas e corporações públicas aceitem ceder parte de seus privilégios em nome do crescimento coletivo. É um preço alto, mas necessário.

O Brasil já demonstrou capacidade de crescer de forma acelerada. O que falta hoje não é criatividade, mas coragem para consolidar regras que sobrevivam a governos e enfrentem privilégios enraizados. Estabilidade política, como já dito, não é ausência de conflito; é a capacidade de decidir e sustentar decisões. Se quisermos retomar um ciclo vigoroso e duradouro de desenvolvimento, o ponto fundamental é planejarmos o nosso futuro, e isso passa inescapavelmente por solidez política e institucional.

Instagram: @edsonbundchen

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