Segunda-feira, 29 de Abril de 2024

Home em foco O surgimento da nova cepa Ômicron de coronavírus põe mais pressão sobre os países ricos para que aceitem a quebra de patentes das vacinas contra a covid

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A velocidade com que a variante Ômicron percorre o mundo renovou o sentido de urgência do debate sobre a suspensão temporária das patentes de imunizantes e remédios usados no combate à covid-19.

O tema segue em discussão há mais de um ano na Organização Mundial de Comércio (OMC) e sofre resistência sobretudo das nações desenvolvidas — em geral sede das grandes farmacêuticas que detêm o monopólio da produção de antígenos. O temor de que novas cepas ponham a perder bilionárias campanhas de vacinação e obriguem governos a retomar os impopulares confinamentos pode finalmente convencer as nações ricas a ceder. Mas só para vacinas.

Distorções históricas

Não é exatamente o que vinham advogando os 60 países em desenvolvimento, liderados pela África do Sul e Índia, que querem também a retirada, durante o período da pandemia, dos direitos de propriedade intelectual de medicamentos e equipamentos usados no tratamento da doença. Esta foi a proposta que apresentaram aos 163 integrantes da OMC em outubro de 2020. O que se discute neste momento é uma alternativa menos ambiciosa — mas que já conta com o apoio de peso dos Estados Unidos, que, na era Trump, eram frontalmente contra qualquer suspensão. Agora, o presidente Joe Biden defende a flexibilização para imunizantes.

A inércia dos últimos meses se justifica. É briga de cachorro grande. Há muito dinheiro em jogo. De lobbies de países ricos com seus orçamentos generosos e a poderosa indústria farmacêutica a nações em desenvolvimento que enfrentam desigualdades sociais gritantes e penúria fiscal. Entre elas, a própria Índia, que, além disso, também é grande produtora de medicamentos genéricos (sobre os quais não incidem patentes).

Permitir que outros países fabriquem vacinas “genéricas”, sem a exigência de direitos de propriedade intelectual durante o período da pandemia, pode ajudar a corrigir distorções históricas criadas pela atual configuração do mercado farmacêutico global. O monopólio da produção de imunizantes por um pequeno grupo de laboratórios não afeta só as nações mais pobres, como muitos imaginam.

O mundo inteiro pagou cinco vezes mais do que deveria pelos antígenos, segundo contas da Aliança People’s Vaccine. Em relatório recente, a entidade acusa a Pfizer e a Moderna, por exemplo, de cobrarem dos governos US$ 41 bilhões acima do custo estimado de sua produção. A Colômbia teria pago US$ 375 milhões acima do preço de custo. Segundo o documento, essas empresas venderam mais de 90% dos imunizantes que produziram até agora para as nações ricas, que teriam pago um preço 24 vezes acima do custo de produção.

Carta de enfermeiros

Sindicatos de enfermeiros de 28 países, que representam 2,5 milhões de servidores da saúde, encaminharam à ONU uma carta em que denunciam a recusa sobretudo do Reino Unido e da União Europeia (UE), além de outros países, em suspender as patentes das vacinas contra a covid-19. Afirmam terem sido testemunha de “números impressionantes de mortes e imenso sofrimento causados por inação política”.

No documento, dizem ainda que, além de extremamente injusto, o chamado “apartheid da vacina” aumentou o risco de surgimento de novas variantes como a Ômicron, que levou dezenas de nações a restringirem, outra vez, viagens e a circulação. Os enfermeiros destacam que os países ricos abocanharam sete bilhões de doses de vacinas. Já os mais pobres não têm mais do que 300 milhões. O Brasil, que chegou a ser contra a suspensão das patentes, “está muito aberto a uma solução comum”, segundo disse um negociador na OMC. Segundo ele, o país “não é um mediador, mas está sendo um bom conciliador”.

A UE, que é contra a suspensão das patentes até mesmo para vacinas, como o Reino Unido, apresentou uma terceira proposta. O documento, que também está sendo avaliado pelos membros da OMC, sugere o aperfeiçoamento do sistema atual. Pela regra prevista no acordo Trips, em tese, já se podem retirar temporariamente os direitos de propriedade intelectual em casos de emergência.

No entanto, existe uma grande dificuldade para que isso aconteça. Os países precisam negociar diretamente com os detentores das patentes — os laboratórios — a sua revogação. Os europeus propõem acabar com a obrigatoriedade. Isso daria fim a longos e custosos processos. Em troca, também querem acabar com a possibilidade de os países suspenderem as exportações de itens médicos durante pandemias, como fez a Índia com seus genéricos usados no tratamento da covid-19 no início da crise sanitária.

As negociações se intensificaram. O tema estava na agenda da reunião de cúpula da OMC, marcada para o último dia 30 de novembro e suspensa justamente por conta da Ômicron. Mas a urgência levou as partes a marcarem duas datas tentativas para novas reuniões, uma na última sexta e outra no dia 16 de dezembro.

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