Terça-feira, 08 de Julho de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 8 de julho de 2025
E se, ao abrir os olhos pela manhã, você percebesse que o mundo inteiro silenciou?
Não, você não morreu, algo diferente aconteceu, como se o universo de repente resolvesse atender aquele seu pedido mais louco. Cansado das pessoas, das maldades do mundo e das decepções, talvez um dia você tenha desejado acordar em um mundo onde não houvesse mais ninguém além de você…
De repente, do nada, seu pedido é atendido, então, você percebe o silêncio barulhento das redes sociais desativadas ou da televisão desligada.
Mas o silêncio nu, cravado nas calçadas vazias, nas cidades sem passos, sem buzinas, sem brigas, sem risos, pode acabar sendo assustador. Imagine você ser o eco dos seus próprios pensamentos…
Para refletir
No filme “Bokeh”, um casal em viagem desperta em uma Islândia deserta. Tudo permanece intacto, o luxo, a tecnologia, os carros, os cafés, as igrejas.
Menos as pessoas. Sem entender o que aconteceu, eles se veem obrigados a confrontar não o fim do mundo, mas o fim da convivência humana.
No entanto, no começo, tudo pode parecer maravilhoso e divertido. Já imaginou um mundo completamente vazio com tudo funcionando, inclusive, a energia elétrica?
Você poderia pegar o carro que você quisesse, entrar no supermercado, comer o que quiser, ir nas lojas usar e pegar absolutamente tudo que você sempre sonhou e desejou. Poderia, inclusive, mudar-se para a casa dos seus sonhos….
Mas, quando menos esperar, estará completamente envolvido em uma overdose de prazeres efêmeros e sem alma. O casal na ficção logo descobre que o maior ruído que o ser humano pode enfrentar é a ausência um do outro….
Há quem diga que prefere estar só. Que os animais são melhores que as pessoas etc. Que o ser humano decepciona, fere, manipula, magoa. E tudo isso pode ser verdade…
Mas mesmo as feridas mais profundas carregam uma revelação: só dói porque um dia houve laços, um elo, uma esperança, depositada uma confiança traída…
A solidão plena, quando não é escolha, mas destino, é o tipo de prisão mais silenciosa e cruel que existe.
Imagine acordar num mundo onde não há ninguém para lhe contradizer; ninguém para lhe olhar atravessado; ninguém para pedir desculpas, nem para exigir que você peça; nenhum trânsito para enfrentar; nenhum chefe para suportar; nenhuma mãe para ligar perguntando se você já almoçou, “ou se levou o casaquinho”…
A princípio, para alguns pode parecer um paraíso, mas não demora muito para virar um pesadelo no deserto.
Já no filme “Passageiros”, com os atores Chris Pratt e Jennifer Lawrence, dois desconhecidos despertam prematuramente em uma nave que leva milhares de humanos adormecidos rumo a uma nova colônia.
São os únicos acordados. Entre a culpa, o amor e o tédio cósmico, descobrem que estar só mesmo em um cenário futurista, tecnológico e confortável é o mesmo que estar incompleto, não importa se você ganhe tudo nas mãos.
Curiosamente, assim como na história de Adão na Bíblia, que mesmo vivendo no paraíso, era vítima da solidão, até que Deus lhe ofereceu Eva…
Porque não importa a sua personalidade, se você é arrogante, tímido, generoso ou insuportável, há algo que você não pode escapar: você é humano. E, sendo humano, é um ser de relação. Você precisa dividir, precisa espelhar, sentir que é visto, que é reconhecido, mesmo nos seus piores dias.
Precisa se apaixonar, se irritar, se emocionar, se decepcionar e principalmente, para sua evolução espiritual, aprender a perdoar.
Você realmente precisa dos outros?
Mesmo que você diga ao contrário, sim, você precisa… Às vezes, aquela pessoa que você acha insuportável, que te persegue, te desafia e pega no seu pé, acaba sendo justamente quem te tira da zona de conforto e, ironicamente, pode ser o mesmo que te impulsiona a seguir em frente, se tornando uma pessoa melhor e mais forte.
A sua felicidade, mesmo que não esteja nos outros, se manifesta quando há alguém para testemunhá-la, é algo contagiante, como se fosse um grito de gol!
Que graça teria dar gargalhadas se não houvesse eco? Que sentido teria um bom vinho sem um brinde? Que valor teria a vitória se não houvesse ninguém para aplaudir ou te dar um abraço?
O verdadeiro sentido da vida não está no acúmulo de bens, nem no luxo da liberdade sem limites. Está na travessia, no passo a passo do dia a dia…
Por isso, antes de desejar um mundo sem ninguém, pense duas vezes. Talvez tudo o que você mais precisa seja justamente o que você mais evita: o outro…
Porque é no abraço, no conflito, no perdão e na partilha que descobrimos o que é viver e ser um humano.
E, se um dia você acordar sozinho, acredite, pode haver várias maneiras disso acontecer. Talvez, sua última prece a Deus seja por mais um olhar, mais um sorriso, mais um abraço, mais uma lembrança, mesmo que seja pela última vez…
* Fabio L. Borges, jornalista e cronista gaúcho
No Ar: Pampa Na Tarde