Sexta-feira, 24 de Janeiro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 8 de maio de 2022
Viktor parecia nervoso quando agentes de segurança ucranianos, mascarados e com trajes antimotim completos, camuflagem e armas entraram em seu apartamento desordenado na cidade de Kharkiv, no norte do país. Suas mãos tremiam e ele tentava cobrir o rosto.
O homem de meia idade chamou a atenção do Serviço de Segurança da Ucrânia, SBU, por postagens em redes sociais que, segundo as autoridades, elogiavam o presidente russo Vladimir Putin por “combater os nazistas”, encorajavam as regiões a se separarem e denominavam a bandeira nacional “um símbolo da morte”.
“Sim, eu apoiei muito (a invasão russa na Ucrânia). Sinto muito. Eu já mudei de ideia”, disse Viktor, a voz trêmula dando claros sinais de coação na presença dos agentes de segurança ucranianos.
“Pegue as suas coisas e vista-se”, disse um policial, antes de escoltá-lo para fora do apartamento. O SBU não revelou o sobrenome de Viktor, alegando a investigação em curso.
Viktor estava entre as 400 pessoas, aproximadamente, apenas na região de Kharkiv, que foram detidas em razão das leis anticolaboração aprovadas com rapidez pelo parlamento ucraniano e sancionadas pelo presidente Volodymyr Zelensky após a invasão russa em 24 de fevereiro.
Os infratores podem ser punidos com até 15 anos de prisão por colaborar com as forças russas, negar publicamente a agressão russa ou apoiar Moscou. Qualquer pessoa cujas ações resultem em morte pode enfrentar pena de prisão perpétua.
“A responsabilidade pela colaboração é inevitável, só resta saber se vai acontecer amanhã ou depois de amanhã”, diz Zelensky. “O mais importante é que a justiça será inevitavelmente feita.”
Embora o governo de Zelensky tenha amplo apoio, mesmo entre muitos falantes de russo, nem todos os ucranianos se opõem à invasão. O apoio a Moscou é mais comum entre alguns residentes falantes de russo da região industrial de Donbass, no leste do país. Um conflito local entre separatistas apoiados por Moscou e forças do governo ucraniano já matou mais de 14 mil pessoas antes mesmo da invasão deste ano.
Empresários, militares e autoridades civis e do governo estão entre as pessoas que se bandearam para o lado da Rússia, e o Departamento de Investigações do Estado da Ucrânia diz que mais de 200 processos criminais sobre colaboração já foram abertos. Zelensky já chegou a destituir dois generais do SBU de suas patentes, acusados de traição.
Um “registro de colaboradores” está sendo reunido e será divulgado ao público, segundo Oleksiy Danilov, chefe do Conselho de Segurança da Ucrânia. Ele se recusou a informar quantas pessoas foram alvo de buscas em todo o país.
Sob a lei marcial, as autoridades baniram 11 partidos políticos pró-Rússia, incluindo o maior deles, que tinha 25 cadeiras entre os 450 membros do parlamento – a Plataforma de Oposição pela Vida, fundada por Viktor Medvedchuk, um oligarca preso que tem estreitos laços com Putin.
As autoridades dizem que os ativistas pró-Rússia no sudeste da Ucrânia, palco do combate ativo, estão agindo como sinalizadores para bombardeio direto.
“Um dos nossos principais objetivos é que ninguém apunhale nossas forças armadas pelas costas”, diz Roman Dudin, chefe do escritório do SBU em Kharkiv, em uma entrevista dada à agência de notícias The Associated Press. Ele conversou com a AP em um porão escuro para onde o SBU transferiu as operações depois que seu prédio no centro de Kharkiv foi bombardeado.
O escritório de Kharkiv vem prendendo pessoas que apoiam a invasão, pedem a secessão e acusam as forças ucranianas de estarem bombardeando as cidades por conta própria.
Acusações de colaboração com o inimigo trazem uma forte carga histórica na Ucrânia. Durante a Segunda Guerra Mundial, algumas pessoas da região ofereceram acolhimento e até cooperação às forças invasoras da Alemanha nazista, depois de anos de repressão stalinista que incluiu o “Holodomor” – um período de fome de causas artificiais que se acredita ter matado mais de 3 milhões de ucranianos. Depois disso, durante muitos anos as autoridades soviéticas alegaram a cooperação de alguns nacionalistas ucranianos com os nazistas como motivo para demonizar as atuais lideranças democraticamente eleitas da Ucrânia.
Defensores de direitos humanos têm ciência de “dezenas” de prisões de ativistas pró-Rússia só em Kiev, desde a aprovação das novas leis, mas quantos foram alvo em todo o país ainda não se sabe, diz Volodymyr Yavorskyy, coordenador do Centro de Liberdades Civis, um dos maiores grupos de defesa de direitos humanos na Ucrânia.
“Não existem dados completos para o país (inteiro), uma vez que tudo é considerado sigiloso pelo SBU”, disse Yavorskyy.
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