Quinta-feira, 18 de Abril de 2024

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Nos acontecimentos do Leste Europeu são poucas as análises e raros os especialistas da região, que nos permitam uma visão menos ocidentalizada, em geral contaminada por categorias conceituais que remontam aos tempos da União Soviética e da Guerra Fria.

Um artigo publicado em O Globo de algum modo supre a lacuna, ao ouvir dois acadêmicos poloneses, Jan Smolenski e Jan Dutkiewicvz, que rebatem interpretações comuns no mundo ocidental, e que eles consideram parciais e limitadas.

Ambos rejeitam a hipótese habitual (no Ocidente, inclusive) de que foi a expansão da OTAN que teria levado a Rússia a uma reação belicosa. Isto é, o ataque de Putin teria se dado porque a Rússia se sentiu insegura, agredida, e teve de reagir.

Como eles explicam, essa versão ignora dois dados fundamentais: a autonomia da Ucrânia – o país não pode ser visto apenas como um peão do qual se possa dispor para atingir objetivos geopolíticos; e as nuances históricas e socioeconômicas das relações russo-ucranianas – o povo ucraniano tem na memória e no sentimento profundo as atrocidades que sofreu em vários momentos da história comum.

Há 43 milhões de ucranianos no país, e embora existam de fato bolsões separatistas pró-russos e grupos neonazistas, a maioria da população tem a manifesta vontade de pertencer ao Ocidente – não é por mera coincidência que vigora no país um grau razoável de liberdade política, de respeito ao voto, e que está em curso um processo de aprimoramento das instituições democráticas.

Os Jans não aceitam a ideia de que se deva buscar atenuantes para a realidade crua: a Rússia é a potência opressora e invasora, a Ucrânia e os ucranianos são as vítimas. Como eles lembram: se em outras regiões do planeta o papel dos americanos nem sempre foi virtuoso, como na América Latina, na Europa Oriental os Estados Unidos tiveram papel positivo e central na derrubada das ditaduras comunistas da região.

Os autores também se insurgem contra o comentário comum de certos grupos políticos, particularmente os grupos identitários, que ao trazer o assunto para o âmbito (quase) único do seu interesse, reduzem-no à condição de um conflito de brancos contra brancos, como quem diz “eles que são brancos que se entendam”.

Eles reagem, por igual, à notícia de que os refugiados brancos (a quase totalidade) sejam acolhidos em países como a Polônia de forma mais humana e calorosa do que as minorias raciais. Seria uma solidariedade seletiva, preferencial para os brancos.

Essas nuances reducionistas, parciais, que enfatizam circunstâncias possíveis, mas com toda a certeza residuais, têm o efeito (senão a intenção), segundo os autores, tão somente de passar o pano, justificar a intervenção russa, atenuar a culpa de Putin e seus asseclas.

Sendo poloneses, Smolenski e Dutkiewicz estão tomados do sentimento comum de todos os povos que um dia já estiveram sob o tacão russo. A antiga União Soviética era uma comunidade de nações, porém com a asfixiante hegemonia da nação maior e mais poderosa, exatamente a Rússia.

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