Segunda-feira, 27 de Outubro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 26 de outubro de 2025
Diante do aumento nas buscas por canetas para tratamento do diabetes e da obesidade e dos preços desses produtos, brasileiros têm usado as redes sociais para compartilhar formas de acesso a versões dos medicamentos vendidas no Paraguai.
“Quero emagrecer e pagar barato”, diz um dos participantes de um grupo com centenas de pessoas no WhatsApp. Nele, usuários mostram resultados de “antes e depois” do suposto uso dos produtos paraguaios — anunciados como tirzepatida, o princípio ativo do Mounjaro — e citam perdas de até 20 kg.
Além dos grupos no WhatsApp, plataformas como Facebook e TikTok reúnem usuários que compartilham tutoriais sobre como adquirir as versões em farmácias paraguaias. A alta demanda de brasileiros levou alguns estabelecimentos, inclusive, a oferecerem atendimento em português.
Nas farmácias paraguaias, as doses mais baixas do produto T.G. (2,5 mg) custam cerca de R$ 294, enquanto as mais altas de Lipoless (15 mg) custam a partir de R$ 770. No mercado brasileiro, segundo a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), o preço de tabela do Mounjaro, em sua dose mais baixa, é de R$ 1.562,66.
Para quem não pode ir ao país vizinho, vendedores oferecem os itens diretamente nos comentários das redes sociais. A reportagem entrou em contato com alguns desses importadores que afirmam ter o produto pronto para entrega em algumas regiões do Brasil. Os preços variam, em média, de R$ 500 a R$ 1.500 dependendo das dosagens.
Marcas paraguaias
Os produtos mencionados nesses grupos são a caneta Lipoless, fabricada pelo laboratório Éticos, e o T.G., vendido em ampolas e produzido pelo laboratório Indufar. Ambos são indústrias farmacêuticas paraguaias.
Para Alexandre Hohl, endocrinologista e diretor da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), os medicamentos comprados no Paraguai têm o mesmo perfil de risco da tirzepatida manipulada vendida em consultórios no Brasil. “O grau de confiabilidade desses produtos é baixo e constitui risco à saúde pública”, ressalta.
Nos grupos, usuários também trocam dicas sobre como fracionar as doses. No entanto, a tirzepatida disponível para venda nas farmácias do Brasil não permite fracionamento. “Não existe fracionamento. Cada caneta do medicamento deve ser utilizada semanalmente”, completa Hohl.
Apenas as canetas importadas da Europa possibilitam o ajuste por contagem de “cliques”. Mesmo assim, segundo Paula Fábrega, endocrinologista do Hospital Sírio-Libanês, a prática não é ideal devido ao risco de erro no cálculo e porque o produto pode ser usado além do prazo de validade após aberto. “A quantidade de cliques varia conforme a concentração da medicação, o que aumenta a chance de erro”, diz.
“A tirzepatida é uma molécula complexa, de difícil síntese. As canetas da farmacêutica (Eli Lilly) passaram por estudos clínicos rigorosos que garantiram sua aprovação por agências sanitárias dos Estados Unidos e da Europa”, explica Paula. Versões sem autorização podem ter segurança e eficácia comprometidas, diz a especialista.
Paulo Augusto Miranda, coordenador da Comissão Internacional da SBEM, questiona a fonte da matéria-prima das versões paraguaias e acrescenta que elas podem não reproduzir as características do Mounjaro. “É importante avançar em estudos de compatibilidade para garantir a segurança, caso essa comercialização seja liberada futuramente após a quebra de patente”, avalia.
Sem receita
Segundo alguns membros dos grupos, nem sempre é necessário apresentar receita médica para comprar o medicamento em farmácias paraguaias — ao contrário do Brasil, onde a Anvisa passou a exigir a retenção de receitas para a venda de remédios agonistas de GLP-1, como tirzepatida e semaglutida, desde o fim de junho deste ano.
Alguns compradores, porém, relatam que precisam mostrar a prescrição para passar pela imigração. Em nota, a Receita Federal informa que a anuência para a entrada de medicamentos no Brasil é da Anvisa e, caso seja um medicamento autorizado pela agência, a Receita fica responsável pelo controle aduaneiro e tributário.
De 2023 a setembro deste ano, foram aprendidas 13.903 canetas de Ozempic, Mounjaro e similares por irregularidades, segundo o órgão. Ainda de acordo com a Receita, a autorização para a entrada no Brasil de passageiros com medicamentos de marcas paralelas, como ocorre com a tirzepatida, só é permitida após análise e autorização da Anvisa. (As informações são do Estado de S. Paulo)