Domingo, 13 de Julho de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 22 de maio de 2023
Gabriel Castillo Jimenez é um bebê de dois anos que vive em Santiago del Estero no norte da Argentina, uma das cidades mais pobres do país. Ele está crescendo e precisa de sapatos novos, mas sua mãe, Julieta Castillo, não tem dinheiro para comprá-los. Ela prefere utilizar a pouca renda que tem para comprar alimentos e evitar que a família passe fome.
Na Argentina, casos como o de Julieta e Gabriel são cada vez mais comuns. Hoje, 54,2% das crianças e adolescentes de 0 a 14 anos vivem em situação de pobreza, segundo o Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec). A situação tem se agravado nos últimos anos, mas não figura entre os temas da campanha das eleições de outubro.
Julieta compartilha a casa com o filho, outros seis irmãos e seus pais. Atualmente desempregada, a renda vem de trabalhos informais e de programas de transferência de renda do governo. A ajuda estatal, no entanto, é insuficiente. Com o aumento da inflação na Argentina, que em 12 meses já supera os 100%, o pouco dinheiro que consegue vale cada vez menos.
Roupa ou comida
Julieta sente na prática o impacto da inflação. Embora trabalhe informalmente com limpezas domésticas e até vendendo pães e doces na rua, sua maior renda vem da Asignación Universal por Hijo, um programa social que, em conjunto com o trabalho informal, lhe permite ter uma renda de de 35 mil a 40 mil pesos mensais (R$ 400). “Utilizo esse dinheiro para comprar alimentos, verduras, frutas e carnes, e sendo sincera ultimamente é só o que ando comprando”.
“A última vez que comprei algo novo para o Gabriel foi em outubro, quando comprei uns sapatos. Mas as crianças crescem e o sapato já não serve mais”. O que ajuda a aliviar a situação, conta, é a ajuda que recebe da ONG Haciendo Camino, que há 16 anos trabalha com nutrição infantil em Santiago del Estero.
Com ajuda da organização, Julieta conta que consegue guardar dinheiro para comprar frutas e verduras, o que não conseguiria só com a renda do governo. Além disso, ela participa de algumas oficinas de costura da ONG, o que a permite costurar roupas que não pode comprar normalmente, como pijamas.
Criados no governo de Cristina Kirchner, em 2009, e inspirado no Bolsa Família brasileiro, a Asignación Universal por Hijo (Subsídio Universal por Filho, em tradução livre) paga hoje 11 mil pesos por mês (o equivalente a R$115).
O mesmo acontece com a Tarjeta Alimentar (Cartão alimentação, em tradução livre), que dá atualmente 17 mil pesos (R$170) para famílias com um filho, 26 mil pesos (R$260) para quem tem duas crianças e 34 mil pesos para pais de três (R$ 340). Para base de comparação, no Brasil, o Bolsa Família paga atualmente R$600, mais R$ 150 por filho até seis anos.
A inflação, no entanto, consome o valor da ajuda rapidamente e a crescente perda do poder de compra desses programas contribui para o aumento da pobreza infantil.
“Os ajustes de valores dessas campanhas não acompanham o ritmo da inflação”, explica Gala Diaz Langou, Diretora Executiva do Centro de Implementação de Políticas Pública para a Equidade e Crescimento (Cippec), organização social com sede em Buenos Aires. “As transferências de renda têm atualizações trimestrais, enquanto os alimentos sobem quase 10% por semana em termos inflacionários”.
Pobreza multidimensional
Em um sinal de que o problema é ainda mais grave, em um levantamento publicado em fevereiro deste ano, a Unicef contabilizou 66% de crianças dentro da chamada pobreza multidimensional, que considera ausências de renda, moradia, saúde, educação, e não apenas a renda familiar, como é o caso do Indec.
“São crianças que vivem em lares que não conseguem adquirir uma cesta básica de alimentos e serviços”, observa Ianina Tuñon, especialista em infância no Observatório da Dívida Social Argentina, da Universidade Católica Argentina. “Mas também existe o nível da indigência, que é quando os lares não acessam nem o básico de alimentação, que também afeta muito mais as crianças que outras populações”.
De acordo com a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), a taxa de pobreza entre crianças e adolescentes é de mais de 45% na América Latina, contra 30% entre adultos de 35 a 44 anos e 16,2% entre os acima de 65 anos. No Brasil a taxa de pobreza infantil é de 63%, segundo o estudo da Unicef.
No Ar: Pampa Na Tarde