Sábado, 08 de Novembro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 8 de novembro de 2025
Esta semana, uma série de manchetes alertou sobre os riscos potenciais do suplemento para dormir melatonina, afirmando que uma nova pesquisa a associou a um aumento de 90% nos casos de insuficiência cardíaca.
A pesquisa é de um estudo ainda não publicado, que será apresentado na conferência científica da Associação Americana do Coração, em Nova Orleans, na próxima semana. No entanto, especialistas em sono afirmam que não é possível tirar conclusões sobre a melatonina a partir desses resultados, apontando algumas limitações importantes do estudo – que ainda não foi revisado por pares –, incluindo o fato de não ter comprovado a relação de causa e efeito.
Uma explicação mais provável para os resultados, argumentam os especialistas, é que a própria insônia – ou uma condição de saúde que pode causar insônia, como a apneia do sono não diagnosticada – seja a culpada. Nesse caso, a melatonina seria uma “coadjuvante inocente”, explica Sujay Kansagra, médico especialista em sono da Duke Health, nos Estados Unidos, que não participou do estudo.
A pesquisa, disse ele, “me deixou com muito mais perguntas do que respostas”.
O que o estudo descobriu? Pesquisadores analisaram registros de saúde internacionais de mais de 130 mil adultos com insônia, divididos em dois grupos: um grupo incluía pessoas que tomaram suplementos de melatonina por pelo menos um ano, e o outro incluía pessoas sem registro de uso de melatonina.
Os pesquisadores, liderados por Ekenedilichukwu Nnadi, chefe em clínica geral e medicina interna na SUNY Downstate Health Sciences University, no Brooklyn, analisaram o risco de insuficiência cardíaca – que ocorre quando o coração não consegue bombear sangue suficiente para fornecer oxigênio aos órgãos do corpo – ao longo de cinco anos.
O risco de insuficiência cardíaca foi de 4,6% para o grupo que tomou melatonina, em comparação com 2,7% para aqueles sem registro de uso de melatonina. Em outras palavras: o estudo sugeriu que as pessoas que tomaram melatonina apresentaram um risco 90% maior de insuficiência cardíaca. Elas também apresentaram uma probabilidade 3,5 vezes maior de serem hospitalizadas por insuficiência cardíaca e o dobro de chances de morrer por qualquer causa.
Nnadi afirmou que era compreensível que esses números chamassem a atenção, visto que a melatonina é um dos auxiliares do sono mais utilizados.
Mas, em sua opinião, algumas manchetes sugerindo que a própria melatonina causa insuficiência cardíaca são “um pouco mais alarmantes do que os dados realmente comprovam”.
Limitações
Uma das principais desvantagens do estudo é que ele contabilizou apenas pessoas com prescrições de melatonina documentadas. No Reino Unido e em diversos países da União Europeia, obter melatonina exige receita médica, mas nos Estados Unidos e em alguns outros países, qualquer pessoa pode comprar suplementos de melatonina sem receita, sem consultar um médico.
Isso significa que alguns dos participantes do grupo que não tomava melatonina no estudo podem, na verdade, ter tomado os suplementos também, mesmo que isso não tenha sido registrado em seus prontuários médicos. Isso dificulta a comparação, diz Andrew W. McHill, cientista do sono e do ritmo circadiano da Oregon Health & Science University.
Também faltaram informações sobre a dosagem de melatonina e a gravidade da insônia, alerta Phyllis Zee, médica e pesquisadora do sono da Northwestern Medicine, que não participou do estudo. Ambos os fatores podem afetar os riscos cardíacos.
Kansagra também observou que o risco de insuficiência cardíaca foi bastante baixo em ambos os grupos.
Para entender se a melatonina aumenta o risco de insuficiência cardíaca, os pesquisadores precisariam realizar ensaios clínicos randomizados e controlados, designando participantes para receber suplementos de melatonina ou placebos, afirma Akinbolaji Akingbola, especialista em medicina do sono da Universidade de Minnesota, que também não participou do estudo.
Nnadi reconheceu a necessidade de mais estudos. Um de seus objetivos ao conduzir o trabalho, disse ele, era incentivar mais pesquisas sobre suplementos vendidos sem receita médica, como a melatonina.
Ele planeja submeter o artigo para revisão e publicação no início de 2026, afirmou.
O estudo apresenta muitas limitações para determinar se a melatonina aumenta o risco de insuficiência cardíaca – ou mesmo se afeta o coração.
Ainda assim, especialistas concordam que é um bom lembrete de quão pouco sabemos sobre a segurança dos suplementos. Os de melatonina podem imitar um hormônio que o corpo produz naturalmente, mas isso não significa que sejam inofensivos, diz Zee.
Tomar melatonina pode ajudar na adaptação a um novo fuso horário ou a ajustar o horário de sono, explica McHill. Mas a maioria dos especialistas em sono concorda que a melatonina não é uma solução eficaz para a insônia. O hormônio age sinalizando ao cérebro que a hora de dormir está se aproximando, e não induzindo o sono diretamente. Em muitos estudos, sua eficácia não é maior do que a de um placebo.