Quarta-feira, 15 de Outubro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 15 de outubro de 2025
Os novos medicamentos aprovados para tratar o Alzheimer nos últimos anos representam um avanço importante na medicina, mas ainda estão longe de significar a cura da doença. “Os pacientes continuam piorando, só que mais lentamente”, explica a professora de Geriatria e diretora do Banco de Cérebros da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Claudia Suemoto, uma das principais pesquisadoras brasileiras sobre o tema.
Descrita pela primeira vez em 1906, a partir da observação de um caso de demência em uma mulher de 51 anos pelo médico alemão Alois Alzheimer, a doença hoje é reconhecida como uma condição neurodegenerativa progressiva que responde por 60% a 70% dos casos de demência no mundo. No Brasil, estima-se que 1,2 milhão de pessoas tenham Alzheimer, com cerca de 100 mil novos diagnósticos a cada ano.
Segundo Suemoto, os avanços científicos das últimas décadas permitiram entender melhor o papel de duas proteínas — a beta-amiloide e a tau — na origem da doença. “Há evidências de que primeiro se acumula a beta-amiloide no cérebro e depois a tau. Esse processo pode começar de 20 a 30 anos antes dos sintomas e está muito relacionado à inflamação cerebral”, explica. O desafio, segundo ela, é descobrir o que desencadeia esse acúmulo. “Mesmo com os novos tratamentos que removem a beta-amiloide, vimos que ela volta a se acumular. Entender esse mecanismo é o foco atual.”
A pesquisadora ressalta que a genética tem papel relevante, principalmente nos casos de início precoce, antes dos 65 anos. “Quanto mais cedo o Alzheimer aparece, mais genético ele tende a ser. Já nos casos tardios, predominam os fatores ambientais”, afirma. Entre os principais fatores de risco estão baixa escolaridade, hipertensão, diabetes, dislipidemia, obesidade e sedentarismo.
Nos últimos anos, a grande revolução tem ocorrido no diagnóstico. “Antes, só era possível identificar o Alzheimer em exames neuropatológicos após a morte. Hoje, conseguimos detectar as proteínas com exames de imagem”, diz. No entanto, os custos ainda são altos e os testes sanguíneos mais modernos, já disponíveis nos Estados Unidos e na Europa, ainda não chegaram ao Brasil. “Precisamos validar esses testes aqui e ampliar o acesso. Cerca de 80% dos casos no país seguem sem confirmação clínica.”
A chegada das novas medicações também representa um marco, embora com limitações. “São anticorpos antiamiloide que removem com bastante eficiência essa proteína do cérebro. Não servem para todos os pacientes, apenas para quadros iniciais e leves”, detalha. Segundo ela, os resultados são modestos. “Os pacientes continuam piorando, mas de forma mais lenta. Há benefício clínico, embora discreto.”
Os efeitos colaterais, contudo, exigem cautela. “Essas drogas podem causar inflamação e inchaço cerebral, além de pequenas ou grandes hemorragias. Em geral, são efeitos temporários e assintomáticos, mas houve casos graves, inclusive fatais”, alerta Suemoto.
Entre os novos estudos promissores, ela cita a trontinemabe, em fase inicial, que promete melhor distribuição do medicamento no cérebro com menos efeitos adversos, e a semaglutida — princípio ativo do Ozempic —, que também está sendo testada para Alzheimer. “Os resultados dessa última devem sair em dezembro, e estou bastante esperançosa”, afirma.
O aumento dos casos é, para a professora, consequência direta do envelhecimento populacional. “A idade avançada é o principal fator de risco. A prevalência dobra a cada cinco anos após os 65. No Brasil, os casos devem triplicar até 2050”, diz.
A prevenção, segundo Suemoto, deve começar cedo. “A meia-idade é uma janela importante. Atividade física regular e dieta saudável são os pilares da saúde cerebral”, recomenda.
No comando do Banco de Cérebros da USP, criado em 2004 e que já reúne mais de 4,5 mil amostras, a pesquisadora destaca descobertas específicas sobre a população brasileira. “O Alzheimer é a principal causa de demência no país, mas a segunda é a demência vascular, totalmente prevenível”, afirma. “Mesmo poucos anos de escolaridade, de um a quatro, já conferem uma reserva cognitiva e protegem da doença. É uma evidência de como a educação é uma poderosa ferramenta de prevenção.”