Sexta-feira, 10 de Outubro de 2025

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Para nós, brasileiros, a história é simples. O avião tem dono, e ele é daqui. Santos Dumont, 14-Bis, Paris — fim de papo. Os tais Irmãos Wright até entram na disputa, mas, por aqui, a gente não vacila na resposta.
Agora, curioso mesmo é pensar nas invenções que nasceram aqui e acabaram no anonimato. Algumas o mundo ignora; outras, nós mesmos deixamos de lado. Separei duas que merecem ser lembradas sem hesitação, criadas — e abençoadas, talvez — por padres católicos.

Rádio

No ringue pelo título de inventor do rádio: os famosíssimos Guglielmo Marconi versus Nikola Tesla. O vencedor: segundo muitos estudiosos, nenhum deles, e sim o porto-alegrense Roberto Landell de Moura, o “padre-cientista”.
Quase ao mesmo tempo em que Marconi fazia sua primeira transmissão com ondas de rádio no Canal da Mancha, nosso padre assustava os presentes em uma demonstração no Colégio Santana em São Paulo. De uma distância de oito quilômetros, fez ecoar as palavras: “Toquem o Hino Nacional”. E isso foi em 1899, vinte e três anos antes da primeira transmissão oficial de rádio no Brasil. Há indícios de que, três anos antes, o padre já realizava dessas proezas na capital gaúcha, antecedendo os gringos na briga pela criação.

Mesmo sem recursos, Landell não parava: desenvolveu projetos ousados de comunicação. Chegou a patentear nos Estados Unidos o transmissor de ondas (precursor do rádio transceptor), o telefone sem fio e o telégrafo sem fio.
Ao voltar para o Brasil, no entanto, encontrou portas fechadas. Faltou apoio, sobrou descrédito. A resistência não era apenas financeira, mas também por temor: ironicamente, muitos acreditavam que as invenções do padre eram “coisas do demônio” ou “ilusão de ótica sonora”.

Desistiu dos experimentos e de falar sozinho. Seguiu apenas na vida religiosa — a glória e o reconhecimento ficaram para outros. Enquanto Marconi ganhou o Nobel em 1909, Landell enfrentava zombaria e isolamento.

Landell morreu em 1928, praticamente desconhecido. Só décadas mais tarde foi homenageado pelo governo brasileiro — uma reparação simbólica apenas, de forma tardia e muito aquém da grandeza de suas obras.

E não foi apenas no campo das transmissões que padres brasileiros se destacaram…

Máquina de escrever

Na teoria: o engenho é atribuído ao americano Christopher Sholes, em 1867, com várias contribuições de outros… americanos. Na prática: anos antes, em 1861, o padre paraibano Francisco João de Azevedo expunha na Exposição Nacional, no Rio de Janeiro, a “máquina taquigráfica” — como batizou sua criação —, um aparelho que imprimia sinais taquigráficos apenas apertando teclas. Ganhou medalha de ouro. Ainda assim, não foi escolhido para representar o Brasil na Exposição Universal, em Londres.

Reza a lenda (e pesquisas também) que padre Azevedo teria sido convencido a entregar a máquina e seus desenhos a um comerciante norte-americano, de passagem pelo Brasil, sob a promessa de encontrar alguém para produzi-la. Coincidência ou não, pouco tempo depois, aparece a máquina de escrever, apresentada e patenteada por Sholes, nos Estados Unidos, com “semelhanças notáveis” à máquina do padre da Paraíba, faltando só a legenda: “Qualquer semelhança NÃO é mera coincidência” — digo eu, a brasileira orgulhosa.
Entre bênçãos e invenções, a batina e a cabeça de cientista, ficaram padres que ousaram não só sonhar além do púlpito, como fazer acontecer. Ficaram também as dívidas de um reconhecimento à altura — uma conta ainda não paga. Talvez contar suas histórias seja, para nós, a forma mais justa de quitação.

  • Dana Badra

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