Quinta-feira, 27 de Novembro de 2025

Home Saúde Remédio para diabetes é esperança contra a compulsão alimentar

Compartilhe esta notícia:

A tirzepatida, medicamento desenvolvido para tratar diabetes tipo 2 e hoje usada também para emagrecimento, pode ter uma função adicional: ajudar a controlar a compulsão alimentar. A hipótese surge de um estudo de caso conduzido pela Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, publicado na revista Nature Medicine, que mostrou que o remédio consegue suprimir temporariamente a sinalização do “centro de recompensa” do cérebro.

A compulsão alimentar e outros comportamentos relacionados ao apetite são regulados por circuitos que envolvem o hipotálamo e estruturas como o núcleo accumbens (NAc), responsável por motivação, busca de prazer e controle de impulsos. Pesquisas anteriores indicam que, em pessoas com obesidade e transtorno de compulsão alimentar periódica, esses circuitos apresentam funcionamento desregulado. Mesmo sem diagnóstico clínico, até 60% dos indivíduos com obesidade relatam “ruído alimentar” — pensamentos constantes sobre comida, que levam a perda de controle e sofrimento mental.

No novo ensaio clínico, quatro participantes com obesidade e episódios recorrentes de perda de controle receberam eletrodos intracranianos para registrar a atividade elétrica no NAc durante a exposição a alimentos que normalmente desencadeiam compulsão. Os eletrodos eram programados para emitir estimulação elétrica de alta frequência sempre que o padrão neural associado ao desejo intenso era detectado. Após seis meses, todos relataram queda acentuada na frequência e intensidade dos episódios de compulsão.

Uma das participantes, chamada no estudo de “Participante 3”, vinha usando tirzepatida para controlar o diabetes antes da cirurgia em que recebeu os eletrodos. Isso permitiu aos pesquisadores observar como o medicamento afeta, em tempo real, os sinais cerebrais relacionados ao comportamento alimentar. Após atingir a dose plena, ela relatou ausência total de preocupação com comida — e a atividade no NAc ficou praticamente silenciosa. Porém, cinco meses depois, os sinais retornaram aos níveis típicos de pessoas com obesidade, acompanhados de relatos de forte preocupação com alimentação. Para os pesquisadores, o efeito da tirzepatida foi marcante, mas temporário.

Nos demais participantes, que não utilizaram a medicação, a atividade no núcleo accumbens permaneceu elevada, consistente com o esperado, reforçando a hipótese de que o remédio foi o principal responsável pela supressão temporária do “ruído alimentar”.

Para Verônica El Afiouni, endocrinologista da clínica INKI, uma possível explicação para a perda do efeito é a neuroadaptação do cérebro. “Com o uso contínuo, pode ocorrer dessensibilização dos receptores GLP-1 e GIP. O cérebro tende a buscar formas de restabelecer o equilíbrio, encontrando ‘atalhos’ para reativar circuitos de recompensa ligados à comida”, afirma.

Wonkyung Choi, coautora do estudo, destacou que, embora apenas um participante tenha usado tirzepatida, os dados mostram de forma convincente como os inibidores de GLP-1 e GIP alteram sinais elétricos cerebrais. Já Lucas Cruz, neurologista em Brasília, pondera que ainda é necessário determinar quanto do efeito vem da ação direta no cérebro e quanto é consequência da maior saciedade promovida pelo remédio. “Faltam dados de longo prazo sobre estabilidade da resposta, adaptações do organismo e se essas drogas realmente tratam a compulsão ou apenas reduzem o peso”, disse.

Para ele, os próximos avanços dependerão de estudos que combinem dados clínicos, neuroimagem e acompanhamento prolongado para identificar quem mais se beneficia da medicação e como integrá-la a terapias e mudanças de hábito.

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Saúde

Um misterioso vírus ancestral revela segredos que podem ajudar a combater superbactérias
Para muitas pacientes de câncer de mama, radioterapia pode ser desnecessária, afirma pesquisa
Deixe seu comentário
Baixe o app da RÁDIO Pampa App Store Google Play
Ocultar
Fechar
Clique no botão acima para ouvir ao vivo
Volume

No Ar: Programa Pampa News