Quinta-feira, 31 de Julho de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 27 de julho de 2025
Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a qualidade dos dados do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (Sirc) revelou um escândalo grotesco: entre 2016 e 2025, o governo federal gastou R$ 4,4 bilhões com o pagamento de benefícios e salários a pessoas mortas. O mais alarmante é que esse descalabro está em curso. Segundo o TCU, R$ 28,5 milhões continuam sendo pagos mensalmente em nome de beneficiários que já não estão vivos. Ou seja, o Estado brasileiro gasta com os mortos enquanto nega dignidade a milhões de vivos. Não há imagem mais cruel da inépcia da máquina pública.
O relatório da Corte de Contas escancara a precariedade de um controle administrativo dos mais básicos no País. No período analisado, aproximadamente 275 mil pessoas mortas “receberam”, por assim dizer, os valores correspondentes a benefícios sociais, como o Bolsa Família, previdenciários e trabalhistas. Entre os mortos, há até funcionários públicos que continuam na folha de pagamento da União. Das duas, uma: ou tamanho descontrole é deliberado, vale dizer, uma fraude para desviar recursos públicos, ou se trata de incúria pura e simplesmente. Seja qual for o caso, está-se diante de um profundo desrespeito com os contribuintes.
Toda essa caríssima bagunça expõe um problema que insiste em aferrar o Brasil ao atraso: a ausência de sistemas confiáveis de verificação de elegibilidade de benefícios e o colapso da articulação entre bases de dados federais, estaduais e municipais. Mais do que um problema técnico, é uma falência política. Como é possível que, em plena era da informação, o Estado brasileiro não consiga saber nem sequer quem está vivo ou morto?
É evidente que, à luz do período analisado, a responsabilidade por essa falha inadmissível não recai apenas sobre um governo. É uma sucessão de mandatos que, por inépcia, desleixo ou cumplicidade, mantiveram operante um sistema que permite desvios grosseiros como os revelados pelo TCU, malgrado silenciosos. Enquanto ainda se gasta bilhões de reais com mortos, o País segue convivendo com a vergonhosa deficiência na oferta de saneamento básico, a precariedade da saúde pública e a crônica deficiência da educação básica. O Orçamento da União, que deveria ser um instrumento de democracia social por excelência, acaba capturado por uma estrutura disfuncional, clientelista e, em muitos aspectos, irresponsável.
Em uma república que se pretende democrática, a transparência e a eficiência no gasto dos recursos públicos não são virtudes, mas deveres. A saúde fiscal do Estado exige escolhas inteligentes e republicanas na definição de prioridades, mas também impõe o desenvolvimento de mecanismos eficazes de controle e correção de desvios. Sem isso, não há planejamento que pare de pé, condenando milhões de brasileiros a uma vida indigna em pleno século 21.
Em números absolutos, a bem da verdade, nem se trata de tanto dinheiro. Mas o que o TCU encontrou decerto é só uma ínfima parte da miríade de dutos por onde escoam outros bilhões de reais à toa, no melhor cenário, ou para enriquecer ilicitamente gente hábil em explorar as deficiências administrativas de um Estado mastodôntico, no pior. (Opinião/Jornal O Estado de S. Paulo)
No Ar: Pampa Na Madrugada