Quinta-feira, 06 de Fevereiro de 2025

Home Economia “Uma coisa é o Haddad falar, outra é convencer o Lula e o PT a fazer”, diz ex-diretor do Banco Central

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O economista Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do Banco Central e presidente do Conselho de Administração da Jive Investiments, mantém uma posição de cautela em relação à política fiscal que será implementada pelo governo Lula e ao impacto que ela terá na economia do País.

Apesar de elogiar as medidas anunciadas na semana passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ele prefere pagar para ver se as promessas de que haverá equilíbrio fiscal a partir de 2024 vão se transformar em realidade. “Uma coisa é o Haddad falar ‘vou trazer a estabilidade fiscal’. Outra é ele conseguir convencer o presidente e o PT a fazer isso”, afirma.

Segundo Figueiredo, porém, a proximidade de Haddad com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o apoio que ele tem da ministra do Planejamento, Simone Tebet, poderá ajudá-lo a levar adiante a tarefa.

Em entrevista ao Estadão, Figueiredo fala ainda que a independência do Banco Central deve funcionar como “um freio” para uma política fiscal expansionista do governo e afirma que um possível “revogaço” nas medidas liberalizantes implementadas nos últimos anos pode ser “um desastre”.

Como o sr. avalia os primeiros movimentos do governo Lula na economia?

O governo começou mal. Antes mesmo assumir, de se estruturar, já trouxe um custo adicional extraordinário ao País, de cerca de R$ 200 bilhões só em 2023, com a chamada PEC da Transição, aprovada pelo Congresso. É louvável que o governo queira honrar os compromissos de campanha, mas não precisa honrar tudo na data zero nem colocar um monte de penduricalho junto. Essa PEC nos distanciou muito do equilíbrio fiscal.

Por que a reação dos investidores em relação à PEC da Transição foi tão negativa?

Porque não dá para desassociar equilíbrio fiscal de responsabilidade social. A gente precisa entender que o Brasil tem uma dívida que é mais alta entre os países emergentes e não tem uma situação fiscal que nos permita manter essa dívida em certo equilíbrio. Para que a gente tenha uma dívida estável, a gente precisa ter um superávit primário da ordem de 2% a 2,5% do PIB ao ano.

Depois dessa fala do Lula que o sr. mencionou, houve também uma perda de valor de mercado muito forte das empresas com ações cotadas na Bolsa. Como a gente deve entender isso?

Toda vez que a Bolsa cai muito, é porque os agentes econômicos estão prevendo que a economia vai sofrer mais à frente. Quando a Bolsa sobe bastante, eles estão prevendo que o ambiente econômico vai melhorar. Depois da fala do Lula, todos os ativos – a curva de juros, a taxa de câmbio e as ações – sofreram muito, em decorrência de uma perda de confiança no que vai acontecer pela frente, principalmente com as empresas estatais listadas em Bolsa.

Agora, de que forma tudo isso afeta o crescimento econômico, os investimentos na produção, o consumo?

Isso gera um aumento de custo à frente – mais inflação, mais juros e eventualmente até mais carga tributária, para cobrir o déficit fiscal. As empresas já estão sofrendo muito com a alta do juro. Se as taxas continuarem altas por mais tempo, em razão de uma política fiscal expansionista, a inadimplência também vai crescer bem mais do que se imaginava.

Até que ponto as medidas fiscais anunciadas na semana passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mudaram essa percepção?

Não dá para tomar as medidas anunciadas pelo ministro pelo valor de face, de R$ 242 bilhões. Mas, quando a gente avalia de forma mais realista o impacto fiscal que essas medidas terão, chega num número bem razoável. Na nossa conta, vai dar mais ou menos uns R$ 150 bilhões. Isso deve reduzir o déficit primário para algo entre -0,5% e -1% do PIB. Ainda não é um bom cenário, mas sem dúvida é um cenário melhor.

Qual o impacto que a independência do Banco Central deve ter?

A independência do Banco Central acaba se traduzindo num freio para que o ambiente não deteriore mais. Hoje, isso está se mostrando como algo fundamental. Agora, o Brasil tem uma institucionalidade que outros países que foram para o buraco não têm e isso vai nos ajudar caso a agenda econômica desse governo seja muito ruim.

Apesar dos desmentidos oficiais, muita gente ainda teme que o governo promova um “revogaço” nas medidas liberalizantes aprovadas nos últimos anos. Qual a sua visão sobre esta questão?

Não sei se haverá um revogaço. Se o governo for por aí, acredito que haverá uma boa dificuldade para que isso aconteça. Agora, quanto mais a gente for para o campo do revogaço, mais para trás o Brasil vai andar. A realização de mudanças no marco do saneamento e na reforma trabalhista – a não ser que sejam para atualizar e modernizar a legislação — pode ser uma sinalização muito ruim.

Para terminar, considerando tudo isso, qual a sua expectativa em relação ao governo Lula na economia?

O que eu gostaria de colocar, que acho importante, é que nós não estamos fadados a entrar numa recessão, a ter uma inflação muito mais alta, juros mais altos etc. Isso tudo pode ser modificado. Estamos numa situação que é reversível.

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