Sexta-feira, 29 de Março de 2024

Home em foco Em um mundo tão conturbado, casais começam a repensar se vão ter filhos ou se postergam a decisão

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Antes de se casar com o marido, Kiersten Little o considerava um pai ideal. “Sempre tivemos aquela mentalidade de ‘ah, sim, quando você se casa, você tem filhos. É o esperado’”, disse ela. Esperado até o casal fazer uma viagem de oito meses depois que Little concluiu seu mestrado em saúde pública na Universidade da Carolina do Norte.

“Quando dirigimos pelo oeste dos EUA (Califórnia, Oregon, Washington e Idaho), passamos por áreas onde toda a floresta estava morta, e as árvores, derrubadas. No sul da Louisiana, que foi atingida por dois furacões no ano passado, cidades inteiras foram arrasadas, com enormes árvores arrancadas pelas raízes”, recorda.

Agora, aos 30 anos de idade e dois de casamento, Little sente “o peso da consciência”. O casal acompanha o crescente caos ao ler os últimos relatórios sobre as mudanças climáticas e fóruns sobre o degelo do Ártico. A ansiedade por ter filhos se instalou.

“No ano passado, pensei:‘ Meu Deus, tenho que tomar uma decisão, não tenho mais tanto tempo. Mas não sei como poderia mudar de ideia. Nos próximos 10 anos, sinto que só haverá mais razões para não querer ter um filho, e não o contrário”, relata.

Pegadas

Esses temores não são necessariamente infundados. Todo novo ser humano vem com uma pegada de carbono. Em uma nota aos investidores no verão passado, os analistas do banco de investimentos Morgan Stanley concluíram que o “movimento para não ter filhos devido aos temores sobre as mudanças climáticas está crescendo e afetando as taxas de fertilidade mais rapidamente do que qualquer tendência anterior no campo do declínio da fertilidade”.

No entanto, há muito debate sobre a ideia de que ter menos filhos é a melhor maneira de resolver o problema. Em uma entrevista à Vox, em abril, Kimberly Nicholas, cientista do clima e coautora de um estudo de 2017 sobre as mudanças mais eficazes no estilo de vida para reduzir o impacto do clima, disse que a redução da população não é a resposta.

“É verdade que mais pessoas consumirão mais recursos e causarão mais emissões de gases do efeito estufa. Mas agora não é realmente o momento mais relevante para realmente estabilizar o clima, visto que temos esta década para cortar as emissões pela metade”, explica Nicholas.

Mesmo assim, a preocupação parece estar ganhando força. Entre os adultos sem filhos nos EUA pesquisados pela Morning Consult no ano passado, um em cada quatro citou a mudança climática como um fator que explica por que não têm filhos no momento.

Outra pesquisa feita em 2018 pela Morning Consult para o New York Times descobriu que, entre os jovens adultos nos Estados Unidos que disseram ter ou esperavam ter menos filhos do que o número que consideravam ideal, 33% listaram as mudanças climáticas e 27% indicaram crescimento populacional como uma preocupação.

Embora as preocupações econômicas permaneçam primordiais, com 64% citando o alto custo dos cuidados infantis, 37% citaram a instabilidade global e 36%, a política doméstica. Para alguns, esses problemas estão todos juntos. Em 2020, a taxa de natalidade americana caiu pelo sexto ano consecutivo, uma queda de 4% que se acredita ter sido acelerada pela pandemia.

O trauma de quase dois anos de coronavírus também fez alguns pais em perspectiva hesitarem. Para Marguerite Middaugh, uma advogada de 41 anos de San Diego, Califórnia, a pandemia, juntamente com a devastação relacionada ao clima, a levou a adiar os tratamentos de fertilidade para o primeiro filho.

“Ver as pessoas não sendo vacinadas, não cuidando de sua comunidade… Isso realmente me fez pensar se eu quero trazer uma criança a este mundo”, afirmou.

Ameaças

Enquanto os custos de moradia crescem exponencialmente, os encargos das dívidas da faculdade, além da chamada recessão sexual para os millennials, influenciam o planejamento familiar para muitos, as ameaças existenciais também fazem parte do cálculo da procriação.

Um aumento do extremismo político, dentro e fora do país. Uma pandemia que matou mais de cinco milhões de pessoas. Inundações que destruíram cidades da Europa Ocidental. Incêndios florestais na costa oeste que crescem em escala cada vez mais inimaginável a cada verão.

Diante de notícias tão alarmantes, alguns futuros pais se perguntam: quão prejudicial pode ser trazer uma criança para este ambiente (literal e figurativo)?

Para Jenna Ross, 36, ceramista do Canadá, a decisão de não ter filhos em um mundo ameaçado pelas mudanças climáticas vem de um instinto protetor. “Aproveitar o amor que tenho por meu filho hipotético e ainda não nascido me consola ao poupá-lo de um futuro inóspito. Dessa forma, minha escolha parece um ato de amor”, afirmou.

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