Segunda-feira, 20 de Maio de 2024

Home em foco Fim do uso de máscaras pode ser gatilho para ansiedade e outros dilemas

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Com o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras contra a covid em vários Estados – em ambientes abertos, na maioria dos casos –, o consenso geral parece ser de alívio. Afinal, ao menos em algumas situações, não é mais obrigatório usar o item para interagir socialmente.

Mas a sensação não vale para todos: especialistas apontam que, nos últimos dois anos, a máscara cumpriu funções que vão além de proteger contra o coronavírus. Entre elas esteve o papel de agir como barreira para evitar o julgamento alheio sobre si mesmo e até mesmo para esconder as próprias emoções.

Alguns grupos, como as pessoas que têm transtornos de ansiedade, também podem ter dificuldades a mais para lidar com a liberação, por medo do contágio.

“O que a gente tem observado na clínica é que a máscara desempenha várias funções para cada um: alguns pacientes temendo tirar a máscara não apenas pelo medo da covid. Cada um foi criando, para si, uma função para a máscara – para além, claro, da proteção contra o vírus”, comenta o psicanalista Wilian D. Fender.

Ele explica que “muitas pessoas acabaram desenvolvendo algumas disfunções importantíssimas em relação à máscara – como, por exemplo, esconder o rosto, ou seja, esconder as expressões”.

Uma pesquisa publicada em novembro passado por cientistas da Universidade de Cardiff, no País de Gales, apontou que usar máscaras afeta a forma com que o cérebro é capaz de criar empatia com emoções alheias – principalmente as positivas, que dependem mais da parte inferior do rosto para serem expressas. (O medo, por exemplo, consegue ser expresso apenas com os olhos).

“Essa mímica facial – em que o cérebro recria e espelha a experiência emocional da outra pessoa – afeta a forma como temos empatia com os outros e interagimos socialmente”, disse o autor principal da pesquisa, Ross Vanderwert, à BBC britânica.

Por que, então, alguns desejariam esconder as próprias expressões – e emoções?

“É muito curioso, porque, se a gente pensa que as expressões dizem muito da gente, acabam revelando bastante coisa, por que será que muita gente acabou colocando para si a máscara como uma proteção dessas expressões para os outros? A máscara foi criando também uma função de esconder as emoções, as expressões. E isso vem junto – as expressões como reveladoras das emoções”, analisa Fender.

Uma segunda questão, também ligada à primeira, é a estética, aponta o psicanalista – de pessoas que dizem que os outros ficam “mais bonitos” de máscara.

“O que tem nisso de que ‘as pessoas ficam mais bonitas de máscara’? Quando a gente diz alguma coisa do outro, está falando alguma coisa da gente também. Isso a psicanálise nos diz bastante: quando a gente fala de alguém, se coloca ali. E, nesse sentido, talvez muita gente esteja receosa de tirar a máscara por, talvez, até se sentir mais bonito, ou de não ter essa preocupação de que o outro possa julgar a aparência”, avalia.

O psicólogo Yuri Busin, doutor em neurociência do comportamento e especialista em terapia cognitivo-comportamental, lembra que as pessoas não são obrigadas a tirar a máscara ou corresponder a expectativas quanto à aparência.

“Na parte estética da situação, ela [a máscara] facilitou para muitas pessoas, e deixava muitas mais seguras sobre algumas coisas. Então, elas vão ter que se modelar novamente. Mas não necessariamente [significa] que ela tem que retirar a máscara e tem que atender o que ela tinha antigamente”, afirma.
Segundo ele, cada pessoa precisa escolher como vai lidar, de agora em diante, com o fato de estar sem a máscara. “Essa é uma escolha dela – não necessariamente ela tem que atender à expectativa alheia. Mas, naturalmente, vai causar um pouquinho de angústia de qual é a atitude que eu devo tomar”, afirma.

O psiquiatra Eduardo Perin, especialista em terapia cognitivo-comportamental, relata que, em seu consultório, as pessoas têm manifestado medo em tirar a máscara, mesmo ao ar livre, por temerem o contágio pela covid.

“As pessoas querem ter certeza absoluta, de 100%, de que elas não vão pegar a doença. E essa certeza realmente não existe. Mesmo com máscara, mesmo com distanciamento, o risco nunca vai ser zero de transmissão”, pontua.
De forma ainda mais específica, quem sofre com transtornos como ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) ou hipocondria – pode vir a ter até mais dificuldade com a retirada da máscara e o medo do contágio.

Essas pessoas, explica Fender, podem, muitas vezes, não ter retomado as atividades fora de casa até agora, mesmo com a máscara.

“Alguns desses pacientes só saem para as atividades mais essenciais – já que eles não saem nem de casa, não vão, muito menos, tirar a máscara na rua. Para muitas pessoas, sair de casa também é uma conquista. Então acho que cada um vai ter o seu tempo de adaptação a essa nova realidade”, pondera.

Os especialistas são unânimes em dizer que cada um terá o seu próprio tempo para lidar com não usar máscara – seja por motivos ligados ao medo do contágio ou por questões estéticas, por exemplo.

Por um lado, é importante não se forçar demais, indo além do próprio limite na exposição a situações sem o acessório. Por outro, é preciso não se acomodar e observar o grau de sofrimento que tirar a máscara traz a si próprio.

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