Quinta-feira, 18 de Abril de 2024

Home em foco Jogar ou engravidar: dilema das atletas brasileiras

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Foi apenas no fim de 2020 que a Fifa anunciou uma reforma em suas regras para tratar da gravidez de atletas do futebol. A nova regulamentação entrou em vigor em 2021 e as jogadoras passaram a ter seus direitos na maternidade garantidos. Conseguiram assegurar, pelo menos, 14 semanas de licença-maternidade, remuneradas a dois terços do salário.

Pela determinação da Fifa, qualquer clube que rescinda o contrato de trabalho com uma jogadora que está ou ficou grávida será obrigado a pagar uma compensação e uma multa e pode ficar impedido de contratar novas atletas por um ano. “A ideia é proteger as jogadoras antes, durante e após o parto. O clube ficará obrigado a reintegrar as jogadoras e lhes proporcionar todo o suporte médico necessário”, diz a Fifa.

No Brasil, a CBF acompanha as diretrizes da Fifa, e o Regulamento Nacional de Registro e Transferência de Atletas do Futebol Brasileiro (RNRTAF) determina que a validade jurídica do contrato de trabalho de técnicas e jogadoras não está sujeita ao fato de elas estarem grávidas ou engravidarem, se estiverem de licença-maternidade ou gozando direitos relativos à maternidade. Além disso, a Constituição e a CLT já garantem esses direitos.

Apesar disso, há receio entre jogadoras de engravidarem durante a carreira, seja por perder espaço, serem dispensadas ou pela falta de estrutura adequada à mãe atleta. “No ano passado, uma jogadora não quis correr o risco de engravidar e ter problemas com o clube e encerrou a carreira. Ela poderia jogar mais dois, três anos em alto rendimento, mas preferiu ser mãe. Nenhuma mulher deve ser obrigada a escolher entre ser jogadora ou mãe. Os clubes, como empregadores, devem respeitar a decisão pessoal da atleta”, analisa o advogado e gestor esportivo Higor Maffei Bellini, que destaca a importância de o clube oferecer infraestrutura e apoio à atleta antes, durante e depois da gestação.

“Tenho uma cliente que é atleta de um clube grande da Série A que está grávida, com previsão de parto para agosto, e o clube prorrogou o contrato, mas não consegui aumentar o salário dela, corrigido pela inflação’’, conta Higor.

Ele diz que queria conseguir para a atleta um auxílio-moradia melhor, para que ela possa pagar o aluguel e levar o marido junto. “Se os jogadores recebem um valor que pode levar a pessoa com quem tem relacionamento, as jogadoras também têm de receber um valor que permita isso. Esse clube impôs o valor do auxílio-moradia, mas não quis negociar. Ou aceitava ou não tinha conversa. Não podemos deixar de renovar, pois ela precisa do plano de saúde e eles têm de cumprir a legislação”, conta Higor.

Dilema

Diferentemente de outras profissões, atletas de alto rendimento sabem que a maternidade implica em mudanças do corpo, seu principal material de trabalho, e o sonho de ser mãe – quando ele existe – acaba adiado. Kamilla, meio-campista do Botafogo, viveu situação contrária. A jogadora deu à luz aos 16 anos e precisou deixar a filha, na época com 4 anos, morando com a mãe, em Belo Horizonte, para seguir o sonho de ser jogadora.

“Na época, escondi minha gravidez durante um tempo porque eu tinha recebido uma bolsa no Colégio Militar, onde eu estudava e jogava futsal. Não escondia da minha família. Minha mãe sempre me apoiou, mas ninguém mais poderia saber daquilo porque eu precisava continuar estudando e jogando bola”, conta.

Sem revelar que era mãe, Kamilla começou a carreira no Rio Preto, em 2015, e foi campeã brasileira logo no primeiro ano de profissional. O título e o sonho realizado teve como preço a distância da filha Kamilli. Ela conta que os primeiros anos foram os mais difíceis, pois perdeu até datas importantes, como aniversários.

“A gente nunca se acostuma com a saudade. Eu também era nova, não sabia viver longe da minha mãe. Tive que amadurecer e fazer com que minha filha amadurecesse com tudo isso também”, diz. “Eu visito ela sempre nas folgas e no final de ano. Tento fazer viagens e outras coisas que não consigo durante a temporada.”

A luta por igualdade de condições de trabalho ainda é um caminho longo não só no Brasil. Na Argentina, por exemplo, até outubro de 2019, o futebol feminino considerava a gravidez como lesão. Isso mudou quando a Associação de Futebol Argentino (AFA) determinou que as jogadoras gestantes passassem a ter seus vínculos e salários mantidos pelo clube durante a gestação.

No entanto, as atletas precisavam assinar um certificado antes de cada partida dizendo que não estavam grávidas, decisão que foi criticada por especialistas.

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