Sábado, 19 de Julho de 2025

Home em foco Novo ministro do Supremo, Cristiano Zanin perde popularidade na esquerda e dá combustível a campanha por mulher negra no Tribunal

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Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) confirmou a indicação de Cristiano Zanin ao Supremo Tribunal Federal (STF), o então advogado desligou celular. Enquanto o aparelho era bombardeado por mensagens de colegas e jornalistas, o futuro ministro comemorava tranquilo com um círculo íntimo a virada iminente na carreira. Um mês após a posse no STF, o cenário é outro. O celular fora de serviço não é mais suficiente para afastar a pressão externa.

Cristiano Zanin vem sofrendo uma pressão pesada de setores da esquerda, inclusive do próprio Partido dos Trabalhadores (PT), por votos considerados conservadores. Lideranças do partido chegaram a divulgar uma resolução com recados velados ao ministro.

O voto da última quinta-feira, 30 de agosto, contra o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, ajudou a desarmar os ânimos.

Em um aceno à base ideológica de Lula, Zanin recebeu a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e se deixou fotografar ao lado dela antes da retomada do julgamento.

Decisões e votos anteriores sobre pautas de costumes e direitos humanos causaram desconforto junto aos setores progressistas.

O ministro foi o único a votar, por exemplo, contra a equiparação dos casos de homofobia e transfobia ao crime de injúria racial. Ele usou um argumento de ordem processual – um suposto alargamento indevido do pedido inicial – e não chegou a entrar no mérito da controvérsia. “Se o Estado tem o dever de zelar pela saúde de todos, tal como previsto na Constituição, a descriminalização, ainda que parcial das drogas, poderá contribuir ainda mais para o agravamento desse problema de saúde”, argumentou no plenário.

A lista, no entanto, não para por aí. O ministro votou contra a abertura de uma ação sobre denúncias de violência policial contra povos indígenas guarani e kaiowá em Mato Grosso do Sul.

O processo é movido pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, que declarou apoio a Lula na eleição.

Zanin ainda negou usar o chamado princípio da insignificância para absolver dois homens condenados pelo furto de um macaco de carro, dois galões de combustível e uma garrafa com óleo diesel, avaliados em R$ 100.

O princípio da insignificância é consolidado na jurisprudência do STF. A essência é que há casos tão irrelevantes, financeira e socialmente, que não vale a pena movimentar o aparelho policial e judicial do Estado em busca de uma punição. A tese vem sendo aplicada a partir de uma dupla perspectiva: criminal e social.

Ao final de seu primeiro mês no STF, Cristiano Zanin acumula no gabinete um acervo de mais de 800 processos.

A maioria das ações é herança do antecessor, Ricardo Lewandowski, aposentado compulsoriamente em abril. Predominam casos de Direito Administrativo e Penal.

Quando sua indicação era apenas uma especulação, poucas vozes da esquerda se insurgiram contra a escolha. Àquela altura, a posição do então advogado sobre temas relevantes no debate público e caros aos setores progressistas era desconhecida.

O criminalista era o advogado que tirou Lula da cadeia na Operação Lava Jato e antagonizou com o então juiz Sergio Moro – e, para muitos, mereceu a cadeira no Supremo, já que a escolha é uma prerrogativa do presidente.

Para Jeferson Mariano Silva, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pesquisador do grupo Judiciário e Democracia (Jude), a indicação está associada justamente com a atuação do criminalista na Lava Jato.

É de autoria de Zanin o recurso ao STF que provocou uma reviravolta na operação, com a declaração de parcialidade de Moro e a reabilitação política de Lula. O professor avalia que o “combate ao populismo penal” foi o eixo em torno do qual a nomeação do advogado foi construída.

“Zanin não chegou ao Supremo por ser um homem de esquerda nem mesmo por ser o advogado do presidente. Ele chegou lá por ter sido o jurista que mais se destacou na demonstração das fragilidades da Lava Jato”, defende Mariano (leia abaixo a entrevista completa). “Foi decisiva a reputação que ele construiu perante os senadores. Boa parte da atual insatisfação de setores de esquerda com os votos de Zanin advém da inadequada desconsideração desse segundo fator.”

A atuação de Zanin no cargo deu combustível ao movimento em defesa da indicação de uma mulher negra ao Supremo Tribunal Federal, o que seria inédito na história da Corte. O STF teve apenas três ministras, todas brancas – Ellen Gracie, Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Lula terá uma nova indicação para fazer com a saída de Rosa Weber, atual presidente do STF, que completa 75 anos neste mês de setembro. A ministra tem um perfil sensível a pautas de direitos humanos.

Um manifesto lançado em conjunto por associações do movimento negro, de mulheres e de juristas cobra representatividade e ataca diretamente Zanin.

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