Sexta-feira, 19 de Abril de 2024

Home Edson Bündchen O Grande erro

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Todas as guerras são moralmente condenáveis, muito embora quem às provoque trate de conferir, geralmente com o uso da mentira, algum tipo de roupagem que às justifique. Todas as guerras também são palco da explicitação visceral da natureza humana, no qual são exacerbadas as assimetrias que na paz também nos dividem e segregam. Não são os generais, engalanados e protegidos em seus abrigos inexpugnáveis, que medem força na lama ensanguentada, mas jovens dos quais a vida é subtraída sem que possam sequer se indignar. Foi da guerra que tratou, há mais de 2.500 anos, o General chinês Sun Tzu. Tratou tão bem essa chaga incrustada na vida em sociedade que é lembrado até hoje, não apenas no meio militar, mas no campo empresarial também. Sun Tzu, para quem conhecer a si mesmo e ao seu inimigo seria a condição primária para qualquer estrategista, ficaria surpreso e decepcionado caso desembarcasse hoje de volta à vida e tomasse conhecimento da atual invasão da Ucrânia pela Rússia. Contemplaria, frustrado, um conflito deslocado do seu tempo, cujos erros de avaliação do seu principal causador, projetam sombras sobre o mundo e denotam que muito pouco do que ensinou o general chinês foi assimilado, particularmente quando este alertava para nunca se ir a um combate sem saber o que pode estar contra você.

Erros de estratégia sempre marcaram as guerras, alguns prosaicos, outros colossais e decisivos. Foi assim quando a Alemanha foi derrotada pelo inverno russo, na Segunda Grande Guerra, na operação Barbarossa; foi igualmente desse modo na invasão soviética ao Afeganistão, e tem sido assim desde sempre. Ao que tudo indica, desgraçadamente, um novo e gigantesco erro está em pleno curso, com a decisão da Rússia em atacar a Ucrânia. Talvez por estar ensimesmado no alto dos seus mais de 20 anos no poder, o Presidente russo, não tenha percebido uma notável transformação social, impulsionada por uma revolução tecnológica que literalmente integrou o planeta e o transformou quase que num único e grande mercado, no qual os interesses estão de tal modo entrelaçados que uma agressão aos seus pressupostos comuns cobra um preço altíssimo. É essa nova realidade que está acossando o regime de Moscou, com as sanções econômicas, de alta magnitude, sendo acompanhadas por uma série de medidas da sociedade civil, num ataque sistemático e abrangente que pode colocar em colapso a economia russa, tornando aquele país um pária internacional, alijado dos principais eventos planetários e sujeito a obliterações que literalmente o colocam à margem do mundo contemporâneo. Esse conceito unificador, essa agenda globalizante que une o mundo contra a Rússia, não se circunscreve somente ao repúdio ao ataque a um país soberano, mas incorpora elementos como um zelo maior com a democracia, com os direitos humanos, com a liberdade, com a autodeterminação dos povos, com a ecologia e, claro, também com a manutenção dos pilares do livre mercado e dos interesses capitalistas.

A eloquente e simbólica suspensão de Putin da Federação Internacional de Judô como presidente honorário, logo após o início da agressão à Ucrânia, abriu um amplo leque de boicote à Rússia, incluindo sua exclusão da próxima Copa do Mundo, dos eventos de Fórmula 1, bem como dos protestos e descontinuidade de negócios por parte de centenas de grandes empresas, a exemplo do Google, Meta, Apple e tantas outras. A conjugação das sanções econômicas, cuja gravidade pode ser medida pelo bloqueio de bancos russos, impedidos de receber moedas estrangeiras através do sistema Swift, aliada ao movimento da sociedade civil, repudiando em larga escala e impacto as ações militares na Ucrânia, talvez não motivem o ditador russo a recuar, pelo menos não neste momento, mas certamente denotam seu grave erro de avaliação em relação à oportunidade desse conflito. Se guerra em si mesma é um erro, mais dramática se torna quando a miopia de seus atores principais não consegue compreender aquilo que um distante general chinês já apontava como crucial no campo de batalha: “evitar guerras é muito mais gratificante do que vencer mil batalhas”.

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