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Por Redação Rádio Pampa | 21 de maio de 2023
O padre de Bauru (SP) que foi excomungado da igreja católica por defender a diversidade sexual considera que os avanços trazidos pela regulamentação do casamento gay, que completou dez anos neste mês de maio, ainda são lentos.
“Poderia ter avançado mais. A gente ainda tem muito a progredir. Nossa sociedade ainda é muito homofóbica, machista e racista”, diz Roberto Francisco Daniel, conhecido como padre Beto, de 57 anos.
Em abril de 2013, Beto foi expulso pela Diocese bauruense depois de publicar nas redes sociais vídeos em que refletia sobre temas como união entre homossexuais e fidelidade e sobre a necessidade de mudanças na estrutura da instituição.
“Acho impossível seguir o evangelho de Jesus Cristo em uma instituição que, no momento, não respeita a liberdade de reflexão e de expressão. O modelo que nós temos que seguir se chama Jesus Cristo e esse modelo viveu plenamente essa liberdade e fez com que as pessoas refletissem”, disse na época.
Um mês depois, em 14 de maio, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou uma resolução que passou a garantir aos casais homoafetivos o direito de se casar no civil. Com a medida, tabeliães e juízes ficaram proibidos de se recusar a registrar a união.
Desde então, os registros em cartório de uniões entre pessoas do mesmo sexo quadriplicou no país, segundo dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil). Os números saltaram de 3,7 mil em 2013 para quase 13 mil em 2022.
O aumento também tem ocorrido no centro-oeste paulista, segundo o ex-sacerdote, que vê a alta ainda refletir nas cerimônias religiosas. “Além de ajudar os casais homoafetivos a oficializar a união, o casamento no civil deu coragem para que eles procurassem realizar essa união também no casamento religioso”.
Mas ele acredita que o avanço poderia ser maior, o que não acontece, de acordo com Beto, por causa dos dogmas cristãos, que atravancam o processo. “A igreja católica continua sendo conservadora, e esse conservadorismo se acentuou com o passar do tempo”, diz.
“A sociedade passou por um período de retrocesso. E a igreja muito mais é influenciada pela sociedade do que a influencia. Falta um concílio que discuta as normas morais e a própria visão de sexualidade que a igreja possui”, explica o padre.
Beto começou a fazer casamentos homoafetivos quatro meses depois da excomunhão. Segundo ele, a iniciativa foi tomada após inúmeros pedidos feitos por casais que passaram a procurá-lo mesmo após a saída dele da igreja. “É claro que eu explicava pra eles que o casamento não tinha validade para igreja católica, mas respondiam: ‘o senhor vem em nome de Deus. É o suficiente’”, conta.
“Eu acho que foi uma forma de eles mostrarem um apoio ou de entenderem a importância da causa. Receber esse apoio foi muito gratificante. Me mostrou que minha missão religiosa não havia acabado. Pelo contrário, havia se ampliado. Fora da igreja, percebi que sou muito mais livre pra poder amar o ser humano”, diz.
Atualmente, o padre faz, em média, oito casamentos por mês, dois deles homoafetivos, em todo o país. Fora das cerimônias, Beto é professor universitário de filosofia, com graduação na área, em direito, história e teologia e doutorado em ética.
“O casamento religioso homoafetivo é importante não somente para os noivos, mas para as muitas pessoas que passaram por aqui e não tiveram a oportunidade de viver o amor como ele deve ser vivido. É também importante para as próximas gerações, para que possam amar de forma natural”, diz Beto.
No Ar: Pampa Na Madrugada