Segunda-feira, 14 de Outubro de 2024

Home Mundo Preços nas alturas assustam a classe média na Argentina

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No auge do inverno portenho, o economista argentino Eduardo Crespo, professor da UFRJ, passou alguns dias em Buenos Aires e precisou comprar roupa de frio. Quando viu os preços se assustou, e adquiriu o mínimo necessário.

A Argentina deixou de ser um país barato para locais e estrangeiros, e alguns produtos, entre eles calçados, eletrodomésticos e roupa em geral, são vendidos a valores que superam os de Estados Unidos e Europa.

Recente pesquisa realizada pelo Centro de Estudos para a Recuperação Argentina da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Nacional de Buenos Aires (UBA), mostrou o aumento do custo de vida na Argentina e deu alguns exemplos.

Para comprar um tênis da marca Nike, um argentino vai precisar gastar 75% do valor do salário mínimo local (em torno de R$ 1.140), contra 23% necessários nos demais países latino-americanos. Na Europa, apontou o estudo, o mesmo produto pode ser comprado com menos de 7% de um salário mínimo.

Alguns itens ainda são bem mais baratos na Argentina, entre elas vinhos e carnes. Mas o custo de vida chegou a níveis similares ao de outros países vizinhos e continua aumentando pela dificuldade do governo em controlar a inflação.

Nos primeiros meses de gestão, o presidente Javier Milei conseguiu conter uma escalada que, segundo economistas, poderia ter arrastado o país para uma hiperinflação. Mesmo assim, a Argentina continua com uma inflação que superou 230% nos últimos 12 meses, o que é um enorme problema para um governo que aposta na recuperação econômica para manter a popularidade.

Bairro popular

Nos comércios mais informais, que conseguem driblar alguns impostos, é possível conseguir roupas mais baratas. A classe média argentina passou a frequentar muito mais o bairro de Flores, onde existe uma concentração de lojas de fabricantes de roupas que vendem os mesmos produtos que podem ser encontrados nos grandes shoppings.

Os argentinos de maior poder aquisitivo que ainda podem viajar, como o advogado Martin Correa, que acaba de voltar dos Estados Unidos, aproveitam para comprar tudo o que conseguem.

“Fomos com quatro malas e voltamos com nove. Um tênis nos EUA custa até 40% menos do que se consegue na Argentina”, comenta Correa.

Para os estrangeiros, o país ficou mais caro não apenas pela inflação, mas também pela decisão do governo Milei de evitar uma desvalorização maior do peso. Quem chega com dólares e reais têm menos vantagens do que tinha em 2023.

“Até o ano passado eu gastava em torno de mil dólares mensais para morar em Buenos Aires, hoje desembolso US$ 1.200. Não é um aumento absurdo, mas se sente”, comenta o americano Chase Washington.

No entanto, o aumento do custo de vida o obrigou a modificar alguns hábitos.

“Quando preciso comprar roupa, ou até roupa de cama e toalhas, encomendo pela Amazon nos EUA e peço para algum amigo ou familiar trazer para mim”, conta Washington.

Se Milei não alcançar o objetivo de ter uma inflação mensal abaixo dos 4%, o país caminha para fechar o ano com uma variação positiva dos preços acima de 60%. O governo flexibilizou o câmbio nos últimos meses, e uma eventual nova desvalorização forte do peso é um componente a mais a pressionar a inflação.

Além disso, a falta de novos investimentos produtivos e importações ainda afetadas pelos controles cambiais criam um problema de baixa oferta interna. Os preços, nesse cenário, continuarão elevados, aponta o economista Gustavo Lazzari:

“A Argentina produz pouco e ainda tem inflação alta. Uma eventual queda dos preços internos dependerá de um aumento da produtividade, que hoje parece difícil. Os empresários nacionais ainda não têm confiança no programa econômico e nas reformas.”

O economista lembra que produtores locais ainda “enfrentam pesada carga tributária, que impacta os preços”.

A arquiteta Agustina Alonso costuma comparar preços de produtos de que precisa para as reformas que faz em apartamentos com sites americanos como a Amazon. Nos últimos meses, ela contou, os valores cobrados por vasos sanitários, por exemplo, passaram a ficar “bem acima do que se consegue nos EUA”.

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